RESUMO
Foram operados, em nosso Serviço, 161 aneurismas da aorta, sendo 99 por dissecção e 62 por outras causas. Em cinco pacientes, os aneurismas eram de localização toracoabdominal, sendo três por degeneração aterosclerótica e dois por dissecção; três pacientes eram do sexo feminino e a idade variou de 31 a 71 anos. Dois pacientes submeteram-se a aneurismectomia previamente (um da aorta ascendente e outro da porção proximal da aorta torácica). Revascularização miocárdica foi feita em um paciente, 40 dias antes da aneurismectomia. A indicação em todos os pacientes foi dor, causada por compressão do aneurisma, sendo que, em dois, havia insuficiência respiratória associada. Todos os pacientes foram operados através de incisão toracoabdominal e abertura do diafragma. A aorta foi substituída por tubo de Dacron, desde sua porção proximal até sua bifurcação, e as artérias viscerais foram implantadas no tubo. Quatro pacientes foram operados com pinçamento da aorta; um paciente necessitou emprego de circulação extracorpórea e parada circulatória, por impossibilidade de pinçamento da aorta junto à artéria subclávia. Todos os pacientes sobreviveram ao ato cirúrgico, ocorrendo dois óbitos no pós-operatório, um subitamente no 12º dia e outro por coma neurológico secundário a parada cardíaca causada por hipoxia.
ABSTRACT
Five patients have been operated on of thoracoabdominal aortic aneurysms. The mean age was 53 years (range 31-71) and three were women. All the patients were symptomatic, three of them had arteriosclerotic aneurysms, and the other two had dissecting aneurysms. Three patients had been operated on previously. The exposure of aneurysm was made through a thoracoabdominal incision, in four patients clamps were placed above and below the aneurysm and it was incised longitudinally. Bypass between left atrium and left femoral artery with hypothermia and circulatory arrest was used in the other patients, since the proximal thoracic aortic clamping was impossible. A woven Dacron graft of adequate size was used to substitute the aorta, intercostals and visceral arteries were reimplanted. Paraplegia occurred in one patient. There was no intraoperative death. Two patients died in the immediate postoperative period, one of them on the 3rd day, by neurologic coma caused by cardiac arrest during the operation, and the other patient on the 12th postoperative day, suddenlly. Three patients were followed up. Two patients are doing well, 13 and 72 months after operation, and the other one has the limitation of the paraplegia.
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AGRADECIMENTO
Agradecemos ao Dr. Júlio César Saucedo Marino, pela sua participação na operação de um dos pacientes.
Discussão
DR. ÊNIO BUFFOLO
São Paulo, SP
Gostaríamos, inicialmente, de cumprimentar o Dr. Januário, pela oportunidade de trazer à discussão uma doença da maior gravidade que, para sua correção, exige equipe altamente diferenciada, habilidade e, acima de tudo, coragem para enfrentar um risco operatório muito alto. Nossa experiência cirúrgica é essencialmente parecida com a apresentada pelos autores e, de um total de 235 lesões operadas da aorta torácica, tivemos apenas quatro casos de aneurismas toracoabdominais. Ressaltaríamos alguns aspectos que, a nosso ver, são de impotância: 1) Quanto à abordagem, utilizamos a toracotomia esquerda, com o paciente entubado seletivamente, excluindo-se o pulmão esquerdo. Nos casos em que existe coto após a subclávia esquerda, não utilizamos circuito extracorpóreo, mas, naquelas situações nas quais o aneurisma é muito volumoso prejudicando a dissecção proximal, ou, ainda, naqueles casos nos quais não existe coto proximal definido, preferimos realizar a derivação extracorpórea parcial veia-artéria femoral com interposição de oxigenador, levando o paciente a hipotermia profunda 20ºC e parada circulatória. Nessas condições, o aneurisma é incisado e fica muito fácil a sutura proximal. Terminado esse tempo, que é, habitualmente, rápido, restabelecemos a circulação extracorpórea, agora com a cânula arterial posicionada na aorta ascendente, e pinçamos o tubo de Dacron, prosseguindo a operação. A desvantagem da necessidade de heparinização é compensada pela possibilidade de aspiração de reaproveitamento do sangue. 2) No que diz respeito ao risco da paraplegia, complicação temívete desastrosa de incidência maior na correção deste tipo de lesão, não conhecemos, da literatura compulsada, maneira eficiente de prevení-la. A aferição dos potenciais evocados durante o pinçamento aórtico não mostrou correlação confiável. Crawford, que detém a maior e melhor experiência mundial neste campo, aconselha o reimplante do tubo de dois pares de intercostais, escolhendo-se os pares mais calibrosos. 3) Acreditamos que a dificuldade maior encontrada neste tipo de intervenção diz respeito à abordagem do coto proximal. A escolha do nível da toracotomia, se alta, favorece esse acesso, mas, em compensação, dificulta o manuseio na aorta torácica baixa. Uma manobra útil é a abordagem através de dois intercostos: o 4º ou 5º para o coto proximal e outra incisão intercostal baixa 7º intercosto para a porção distai, prosseguindo-se a operação como os autores preconizam. Gostaríamos, finalmente, de perguntar ao Dr. Januário se o paciente que havia sido revascularizado 40 dias antes era portador de aneurisma dissecante, se, em seus cinco casos, preocupou-se em reimplantar a mesentérica inferior, sendo este aspecto polêmico na literatura, e, finalmente, se ocorreu e como manejaram a hipertensão arterial proximal durante o pinçamento da aorta após a subclávia. Reinteramos, ao final deste comentário, a excelência da apresentação deste assunto, ressaltando que em 18 Congressos de nossa Sociedade, é a primeira vez que este assunto é abordado de maneira corajosa e com bons resultados.
DR. HENRIQUE MURAD
Rio de Janeiro, RJ
Agradecemos à Comissão Organizadora do 18? Congresso Nacional de Cirurgia Cardíaca a oportunidade de comentar este trabalho. Parabenizamos os autores, pelo modo como conduziram estes difíceis casos. No Serviço de Cirurgia Cardíaca e Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, foram realizadas cirurgias para tratamento de aneurismas toracoabdominais em 12 pacientes. Gostaríamos de tecer algumas considerações sobre as técnicas usadas nessas operações. Em nove pacientes, foi usada a técnica dássica preconizada por Crawford. Quatro pacientes tiveram excelente evolução. Quatro faleceram como conseqüência de complicações cirúrgicas (hemorragia pulmonar, insuficiência respiratória e discrasia sangüínea) e um paciente permanece paraparético. Em dois pacientes, usamos derivações para os vasos viscerais a partir da aorta descendente, durante o pinçamento aórtico. Essa técnica foi descrita por Korompai e colaboradores, em 1975. (Buli. Texas Heart. Inst., 2:349,1975). Cânulas de perfusão coronariana tipo De Bakey foram usadas para nutrir os vasos viscerais. Em um dos pacientes, houve, inclusive, produção de urina durante o pinçamento aórtico. Esses dois pacientes estão vivos, sendo que um deles permanece bem, 12 anos após a cirurgia. Um último paciente, operado há quatro anos para ressecção de aneurisma de aorta ascendente e troca de valva aórtica, foi submetido com sucesso a ressecção de aneurisma toracoabdominal com parada circulatória total. Neste caso, usamos a técnica de CEC, preconizada por Kouchouko (J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 99: 659, 1990). O retorno venoso foi obtido por cânulas introduzidas pela veia femoral e artéria pulmonar, e o retorno arterial foi obtido pela artéria femoral. Ao fim da anastomose proximal, uma cânula colocada através de enxerto permitiu o reinício da perfusão cerebral e retirada de ar do arco aórtico. Em todos esses casos, foi usado acesso retroperitonial e retro-renal esquerdo à aorta abdominal. A pré-coagulação do enxerto foi feita com plasma homólogo ou albumina em autoclave a 120 F por cinco minutos. Os enxertos usados foram tipo "very soft woven" (Vaskutek, Meadox). Recentemente, começamos a usar enxertos de Dacron revestidos internamente por pericárdio bovino (Labcor), obtendo ausência total de extravazamento sangüíneo através do enxerto. Nos casos de dissecção aórtica, usamos cola biológica (Colagel-Cirumédica) e reforço da sutura com feltro de Teflon. Para evitar paraplegia, foram reimplantadas artérias intercostais sempre que possível, usado corticosteróides e drogas que neutralizam radicais livres (alopurinol, tocoferol). Não temos experiência com drenagem de liqüido céfalo-raquidiano ou a injeção de papaverina intratecal preconizados por Jversson (Ann. Surg., 204: 38, 1986).
DR. SOUZA
(Encerrando)
Agradeço os comentários do Dr. Murad e o cumprimento pelos seus resultados. A denominação toracoabdominal engloba aneurismas de extensão variável e a classificação proposta por Crawford é de grande utilidade, para compararmos graus de dificuldade e de risco cirúrgico. Realmente, os enxertos de Dacron com revestimento interno de pericárdio são um grande avanço; infelizmente, esses enxertos ainda são fornecidos com apenas 20 cm de comprimento: portanto, não podem ser utilizados em aneurismas de grande extensão. Ao Professor Buffolo, agradeço os estimulantes comentários e concordo em que a circulação extracorpórea com hipotermia e parada circulatória facilita a anastomose proximal do tubo à aorta. Em nossos pacientes, reimplantamos no tubo duas ou três artérias intercostais da porção terminal da aorta torácica, o que, segundo Crawford, diminui a incidência de paraplegia. O paciente previamene operado para revascularização miocárdica era potador de extenso aneurisma aterosclerótico. Em nenhum dos pacientes a artéria mesentérica inferior foi reimplantada, pois estava acluída. Finalmente, quanto à hipertensão arterial proximal, que sempre ocorre após o pinçamento, foi controlada com infusões de nitroprussiato de sódio - um recurso que pode também ser usado é a utilização de bomba centrífuga com bypass átrio esquerdo-femoral, mas que não utilizamos. Agradeço os comentários do Prof. Domingos Junqueira de Morais, e, quanto ao seu trabalho publicado na revista "O Hospital", teria imenso prazer em citá-lo; portanto, gostaria de receber uma separata. Dr. Paulo Paulista, muito obrigado por seus comentários; quanto à sua pergunta sobre problemas com o baço, houve rotura em um paciente, sendo necessária a esplenectomia.
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