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ARTIGO ORIGINAL

Eficiência da correção endoventricular com patch em pacientes com grande área acinética pós-infarto do miocárdio e severa disfunção ventricular

Gustavo Calado de Aguiar Ribeiro0; Cledicyon Eloy COSTA0; Maurício Marson Lopes0; Ana Paula Nunes de ALBUQUERQUE0; José Pedro da Silva0

DOI: 10.1590/S0102-76382002000100004

RESUMO

OBJETIVO: Verificar a eficiência da técnica de plastia endoventricular com patch circular nos casos com grande área acinética causada por infarto agudo do miocárdio prévio no ventrículo esquerdo e com severa depressão da função ventricular. CASUÍSTICA E MÉTODOS: Este estudo evoluiu resultados hemodinâmicos da plastia endoventricular com patch circular em pacientes com grande área acinética (9 casos) e grande área discinética (11 casos) e ambos apresentando severa depressão ventricular (fração de ejeção < 35%). A distinção destes dois grupos foi feita através de ventriculografia radioisotópica. Os grupos foram comparados por ecocardiografia e estudo hemodinâmico através de cateter de Swan-Ganz no pré e pós-operatório. RESULTADOS: Os resultados mostraram uma imediata melhora na classe funcional, melhora estatisticamente significativa (teste T de Student) na fração de ejeção (de 25 ± 0,8% para 39 ± 1,6% nos acinéticos e de 27 ± 0,7% para 41 ± 1,6% nos discinéticos), diminuição do capilar pulmonar (20 ± 1,2 mmHg para 12 ± 1,2 mmHg nos acinéticos e de 17 ± 0,5 mmHg para 11 ± 0,9 mmHg nos discinéticos), diminuição dos índices volumes sistólico (de 176 ± 9,2 ml para 77 ± 6,2 ml no acinéticos e de 160 ± 10 ml para 66 ± 2ml nos discinéticos) e diastólico (de 226 ± 11 ml para 115 ± 8 ml no acinéticos e de 209 ± 11 ml para 96 ± 5,0 ml nos discinéticos) final do ventrículo esquerdo. A pressão arterial pulmonar também diminuiu, embora não significativa. A mortalidade global foi de 10%, sendo 2 óbitos no grupo acinesia (22,2%) e nenhum no outro grupo. CONCLUSÃO: Os resultados imediatos obtidos são comparáveis aos descritos na literatura. Acreditamos que a técnica de reconstrução endoventricular com patch circular seja efetiva e possa ser usada como opção cirúrgica para casos de extensa disfunção cardíaca e grande área acinética.

ABSTRACT

PURPOSE: Efficacy of endoventricular patch plasty in large postinfarction akinetic scar and severe left ventricular dysfunction. METHODS: This study evaluated clinical and hemodynamic results of endoventricular circular patch plasty in patients with either large akinetic scar (n=9) or large dyskinetic scar (n=11) and depressed left ventricular function (ejection fraction < 35%). The difference between akinetic and dyskinetic left ventricular aneurysms was diagnosed by gated radionuclide ventriculography. Groups were comparable for symptons and by echocardiography and by hemodynamic before and after the surgery. RESULTS: Results showed an early improvement in New York Heart Association functional class. Statistically (the Student t test) an improvement occurred in left ventricle ejection fraction (from 25 ± 0.8% to 39 ± 1.6% in akinetic patients and from 27 ± 0.7% to 41 ± 1.6% in dyskinetic patients), decreased of capillary wedge pressure (20 ± 1.2 mmHg to 12 ± 1.2 mmHg in akinetics and 17 ± 0,5 mmHg to 11 ± 0.9 mmHg in dyskinetics patients), decrease end-diastolic volume index (226 ± 11 ml to 115 ± 7,8 ml in akinetics and 209 ± 11ml to 96 ± 5ml in dyskinetics) and end-systolic volume index (176 ± 9.2 ml to 77 ± 6.2 ml in akinetics and 160 ± 10ml to 66 ± 2ml in dyskinetics patients. Overall operative mortality was 10% (2 cases in akinetic group = 22.2%). CONCLUSION: We find that endoventricular circular patch plasty technique allows an effective correction and provides a significant improvement in cardiac function in patients with large postinfarction akinetic scar and severe left ventricular dysfunction.
INTRODUÇÃO

O aneurisma de ventrículo esquerdo (Aneu VE) é a complicação mecânica mais freqüente após o infarto agudo do miocárdio e sua ressecção cirúrgica continua sendo o tratamento de escolha para aqueles que apresentam sintomas (angina, insuficiência cardíaca congestiva, arritmias e tromboembolismo). Esta aceitação ganhou maior ênfase a partir de meados da década de 80, quando JATENE (1) introduziu o conceito de correção geométrica destes aneurismas, sendo seguido por DOR et al.(2) e COOLEY (3).

Essa região cicatricial do ventrículo esquerdo (Aneu VE) pode apresentar uma movimentação sistólica paradoxal (discinesia) ou mesmo não ter movimento (acinesia). Tem sido destacada na literatura uma evolução menos favorável para pacientes que apresentam acinesia, principalmente quando essa área acinética for grande e a função ventricular global se encontrar deteriorada.

Neste estudo, procuramos avaliar a eficácia da técnica descrita por DOR et al. (4) a plastia com patch endoventricular, em pacientes com grande área acinética e com severa depressão da função ventricular, comparando com pacientes que foram submetidos a correção de áreas discinéticas e também deteriorada função cardíaca.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

No período de janeiro de 1997 a janeiro de 2000, 41 pacientes foram submetidos à correção cirúrgica de Aneu VE pelo nosso Serviço.

Na seleção de casos, 21 pacientes foram retirados do estudo por não terem sido operados pela técnica de correção descrita por DOR et al. (4), por apresentarem fração de ejeção pré-operatória maior que 35% ou por não apresentarem dados completos.

Os pacientes incluídos (20 casos) sofreram infarto agudo do miocárdio anterior e tinham Aneu VE ântero-apical e fração de ejeção menor que 35%.

Submeteram-se a cinecoronariografia, ventriculografia, ecocardiografia, avaliação de viabilidade miocárdica por ventriculografia radioisotópica, e estudo hemodinâmico com cateter de Swan-Ganz. No pós-operatório, foram repetidas as medidas hemodinâmicas através do cateter de Swan-Ganz e ecocardiografia. A distinção entre acinesia e discinesia foi feita pela ventriculografia radioisotópica por análise qualitativa e imagem paramétrica de fase e posteriormente, os pacientes foram separados em dois grupos. No grupo A, 9 pacientes com acinesia e, no grupo B, 11 pacientes com discinesia. Os dados pré-operatórios estão na Tabela 1.



Todos os pacientes foram operados com sistema de circulação extracorpórea a 34ºC. Foi usada cardioplegia sangüínea hipotérmica, enriquecida por aspartato e glutamato, infundida por via anterógrada e retrógrada. A técnica cirúrgica usada, plastia endoventricular com patch de Dacron (Hemashield: Meadox Medical, Inc, Oakland), foi descrita por DOR et al. (4), em 1984.

A revascularização do miocárdio foi empregada sempre que indicada, usando-se como enxertos a artéria torácica interna e veia safena.

RESULTADOS

Os dados referentes ao procedimento cirúrgico encontram-se na Tabela 2.



Tivemos um maior tempo de perfusão e de pinçamento aórtico no grupo A. Somente em 1 paciente não foi feita revascularização do miocárdio, sendo este do grupo B. O uso de artéria mamária e o número de anastomoses distais foram similares nos dois grupos. A mortalidade hospitalar foi de 10%, sendo 2 óbitos no grupo de acinesia (2/9 pacientes) e nenhum no outro grupo.

Os dados hemodinâmicos colhidos por ecocardiografia e monitorização por cateter de Swan-Ganz no pré e pós-operatório estão na Tabela 3.

Os dados estatísticos (teste T de Student) demonstraram melhora na medida do capilar pulmonar, na fração de ejeção, índice de volume diastólico e sistólico finais quando foram comparados com os dados basais de cada grupo.

COMENTÁRIOS

O seguimento clínico de pacientes com Aneu VE mostra maior sobrevida para os pacientes que se comportam clinicamente assintomáticos. GRONDIN et al. (5), em 1979, mostravam uma sobrevida de 90% em 5 anos para pacientes com Aneu VE em assintomáticos, e apenas 47% de sobrevida para os sintomáticos no mesmo intervalo de tempo. Entretanto, o estudo CASS (6) apontou um prognóstico significativamente pior para indivíduos com Aneu VE com pobre função ventricular e extensa doença coronariana, a despeito da sintomatologia.

Assim, com estes dados, houve uma ampliação na indicação cirúrgica de pacientes portadores de Aneu VE, impulsionada, principalmente, pela introdução de novas técnicas de reconstrução do ventrículo de forma geométrica por JATENE (1), DOR et al. (2) e COOLEY (3).

Os resultados apresentados por JATENE (7), em 1381 pacientes com mortalidade imediata de apenas 5,8% e tardia de 4.5% e por DOR et al. (8) em 715 pacientes com mortalidade em 30 dias de 7%, sendo que 34% destes pacientes eram portadores de grave disfunção ventricular, fortaleceram a extensão da indicação cirúrgica.

Resultados concordantes de vários autores apontam uma evolução mais favorável naqueles que apresentavam discinesia e foram submetidos a aneurismectomia. MANGSCHAU (9) encontrou melhora da classe funcional (New York Heart Association) e uma maior tolerância ao exercício quando comparou discinesia e acinesia, estas diagnosticadas por ventriculografia radioisotópica.

COUPER et al. (10), analisando 303 portadores de Aneu VE num seguimento de 5 anos, encontraram menor mortalidade operatória (8% versus 18%) para pacientes com discinesia e maior sobrevida 63% contra 51% em acinéticos.

DI DONATO et al. (11), em uma série de 245 pacientes (125 com discinesia e 120 com acinesia), usando a técnica descrita por Dor, dividiram-nos em dois grupos, de acordo com a extensão da área comprometida do ventrículo esquerdo (área comprometida maior ou menor que 60%). Encontraram uma mortalidade de 12,5% para casos de acinesia com grande área comprometida e nula para aqueles de acinesia com pequena área comprometida.

O determinante na diferente evolução entre pacientes com acinesia e com discinesia não é atividade mecânica dessa área infartada, mais sim, a atividade mecânica da parte não infartada imediatamente adjacente à área lesionada. A função sistólica desses segmentos adjacentes está preservada e rapidamente diferencia-se do segmento infartado nos casos de pacientes com discinesia. Ao contrário, pacientes com acinesia apresentam esses segmentos afinados, remodelados e hipocontrácteis que se misturam com a área lesada. Esses casos com acinesia tipicamente têm função ventricular ruim (Figura 1) e clinicamente têm insuficiência cardíaca congestiva.



Recentemente, face ao aumento da população coronariana em estágio final de doença isquêmica e limitado número de doadores para transplante cardíaco, terapias alternativas para alívio dos sintomas e aumento da sobrevida têm sido exploradas. Neste contexto, DOR (12) e MICKEBOROUG (13) têm proposto excisão do aneurisma que apresenta comprometimento global da função ventricular e também com difícil distinção do segmento miocárdio ao aneurisma e este.

Deparamos-nos com pacientes mostrando grave disfunção ventricular e acinesia e, frente à restrição do número de doadores para transplante cardíaco, procuramos uma alternativa cirúrgica. A redução de volume, através de cardiectomia lateral proposta por Batista, não se aplica para esses pacientes onde a área lesada é anterior e septal, e a área lateral não é isquêmica e fibrosada. A cardiomioplastia somente previne dilatação futura, não reduzindo o tamanho da câmara, além do que não apresenta resultados imediatos e, ainda, muitos dos pacientes têm critérios de contra-indicação, como a classe funcional (NYHA IV).

DOR et al. (14) apontam como vantagens do patch endoventricular para esses casos: (a) reconstrução geométrica; (b) permitir a exclusão de áreas não fibróticas não ressecadas, como o septo ventricular; (c) redução da cavidade ventricular; (d) revascularização de todos os territórios, o que melhora a contratilidade e diminui a ocorrência de arritmias.

Nos nossos pacientes, encontramos resultados próximos aos da literatura quanto à mortalidade hospitalar (22,2% no grupo com acinesia e 10% no geral), apesar do número restrito de pacientes. Esses óbitos ocorreram por falência de múltiplos órgãos decorrente de choque cardiogênico e o outro por complicações pulmonares. Quanto aos dados hemodinâmicos, percebemos uma melhora expressiva nos dois grupos com diminuição dos volumes sistólico (Figura 2) e diastólico final do ventrículo esquerdo.



O uso de balão intra-aórtico foi maior do que o encontrado na literatura, justificado pelo quadro grave destes pacientes com rebaixada fração de ejeção e alta pressão capilar pulmonar.

Houve melhora clínica significativa para os dois grupos de pacientes e melhora da fração de ejeção (23% para 39%) demonstrada ao ecocardiograma de controle na alta hospitalar.

Concluímos que a técnica de reconstrução ventricular com patch endoventricular, descrita por Dor, para aneurisma é eficiente e pode ser uma alternativa para pacientes com evolução clínica desfavorável.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Jatene A D ¾ Left ventricular aneurysmectomy: resection or reconstruction. J Thorac Cardiovasc Surg 1985; 89: 321-31.
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2 Dor V, Kreitmann P, Jourdan J et al. ¾ Interest of physiological closure (circumferencial plasty on contractile areas) of left ventricle after resection and endocardectomy for aneurysm or akinetic zone: comparison with classic technique about a series of 209 left ventricular resections. J Cardiovasc Surg 1985; 26: 73.

3 Cooley D A ¾ Ventricular endoaneurysmorrhaphy: a simplified repair for extensive postinfarction aneurysm. J Card Surg 1989; 4: 200-5.
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4 Dor V, Saad M, Coste P et al. ¾ Left ventricular aneurysm: a new surgical approach. Thorac Cardiovasc Surg 1989; 37: 11-9.
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5 Grondin P, Kretz J G, Bical O, Donzeau ¾ George P, Petitclerc R, Campeau L ¾ Natural history of saccular aneurysm of the left ventricle. J Thorac Cardiovasc Surg 1979; 77: 57-64.

6 Faxon D P, Ryan T J, David K B et al. ¾ Prognostic significance of angiographically documented left ventricular aneurysm from the coronary artery study (CASS). Am J Cardiol 1982; 50: 157-64.
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7 Jatene A D ¾ Surgical treatment of left ventricular aneurysm. In: Baue A E, Geha A S, Hammond G L, Laks H, Naunheim K S, eds. Glenn's thoracic and cardiovascular surgery. 5 ed, vol 2. Normalk: Appleton & Lange Publishers, 1991: 1829-36.

8 Dor V, Sabatier M, Di Donato M et al. ¾ Late hemodynamic results after left ventricular patch repair associated with coronary grafting in patients with post-infarction akinetic or dyskinetic aneurysm of the left ventricle. J Thorac Cardiovasc Surg 1995; 110: 1291-301.
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9 Mangschau A ¾ Akinetic versus dyskinetic left ventricular aneurysm diagnosed by gated scintigraphy: difference in surgical outcome. Ann Thorac Surg 1989; 47: 746-51.
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10 Couper G S, Bunton R W, Birjiniuk V et al. - Relative risks of left ventricular aneurysmectomy in patients with akinetic scars versus true dyskinetic aneurysms. Circulation 1990; 82 (5 suppl): IV 248-56.

11 Di Donato M, Sabatier M, Dor V, Toso A, Maioli M, Fantini F ¾ Akinetic versus dyskinetic postinfarction scar: relation to surgical outcome in patients undergoing endoventricular circular patch plasty repair. J Am Coll Cardiol 1997; 29: 1569-75.
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12 Dor V ¾ Reconstructive left ventricular surgery for post-ischemic akinetic dilatation. Semin Thorac Cardiovasc Surg 1997; 9: 139-45.
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13 Mickleborough L L ¾ Left ventricular aneurysmectomy. In: Franco K L, Verrier E D, eds. Advanced therapy in cardiac surgery. Hamilton: BC Decker Inc, 1999. 347-53.

14 Dor V, Sabatier M, Di Donato M, Montiglio F, Tosa A, Maioli M ¾ Efficacy of endoventricular patch plasty in large postinfarction akinetic scar and severe left ventricular dysfunction: comparison with a series of large dyskinetic scars. J Thorac Cardiovasc Surg; 116: 50-9.
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Article receive on domingo, 1 de julho de 2001

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