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TECNOLOGIA EM EVOLUÇÃO/CIENCIA BÁSICA

Revascularização da artéria coronária direita com enxerto venoso coronária-coronária

Andrea Cristina Oliveira FreitasI; Wladmir Faustino SaporitoII; Luis Antonio DonelliI; João Roberto BredaIII; Leandro Neves MachadoIV; Louise HoriutiIV; Adilson Casemiro PiresV

DOI: 10.1590/S0102-76382009000400022

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a experiência do Serviço de Cirurgia Cardiovascular da Faculdade de Medicina da Fundação do ABC com a revascularização do miocárdio com ponte coronária-coronária. MÉTODOS: Foram analisados quatro pacientes submetidos a operação com ponte coronária-coronária, todos sem circulação extracorpórea. Em todos os casos, foi realizada ponte coronária-coronária na artéria coronária direita exclusivamente, utilizando segmento da veia safena magna. RESULTADOS: Não houve nenhuma intercorrência intra ou pós-operatória. O tempo de seguimento variou de 3 a 5 anos. Apenas um dos pacientes apresentou angina após quatro anos da operação, sendo submetido a cinecoronariografia, que demonstrou ponte coronária-coronária livre de lesões. CONCLUSÃO: A ponte coronária-coronária constitui opção viável e satisfatória para pacientes submetidos à revascularização do miocárdio

ABSTRACT

OBJECTIVE: The following report describes the experience of the Cardiovascular Surgery Team of the ABC Medical School with coronary-coronary bypass grafting. METHODS: Four patients undergone off-pump coronary artery bypass grafting, with coronary-coronary bypass of the right coronary artery, by using great saphenous vein graft. RESULTS: The follow-up period was 3 to 5 years without any intra- or postoperative recurrence. One patient presented anginal symptoms four years after the surgery and underwent cinecoronariography that revealed patent anastomosis. CONCLUSION: The coronary-coronary bypass is a good option for patients undergone coronary artery bypass grafting
INTRODUÇÃO

A aterosclerose grave da aorta ascendente constitui fator de risco para o aumento da morbidade e mortalidade perioperatória em revascularização cirúrgica do miocárdio, em vista da possibilidade de embolia sistêmica e, principalmente, central. Estima-se que este problema esteja presente em até 13% dos pacientes submetidos a este procedimento, principalmente durante a canulação da aorta junto ao tronco braquiocefálico para o uso na circulação extracorpórea. Nestes casos, a manipulação da aorta deve ser evitada [1].

Uma das alternativas para reduzir a incidência de ateroembolismo é a realização da operação sem circulação extracorpórea. A não manipulação da aorta pode ser alcançada por meio de técnicas que excluam a aorta como sítio das anastomoses proximais dos enxertos, como o uso de ambas as artérias torácicas internas e enxertos sequenciais. Além disso, a ponte coronária-coronária, pela facilidade técnica e perviedade satisfatória a longo prazo, também deve ser considerada pelo cirurgião [1-3].

O objetivo dos autores é reportar a experiência do Serviço de Cirurgia Cardiovascular da Faculdade de Medicina da Fundação do ABC na realização da revascularização do miocárdio com ponte coronária-coronária.


MÉTODOS

No período de 2003 a 2005, foram realizadas 287 operações de revascularização do miocárdio pelo Serviço de Cirurgia Cardiovascular da Faculdade de Medicina da Fundação do ABC. Destes, quatro (1,39%) pacientes foram submetidos à operação com ponte coronária-coronária, sendo três por apresentarem aorta em porcelana e um por escassez de enxerto.

Os quatro pacientes eram do sexo masculino, com idade de 73, 79, 74 e 63 anos. Todos os procedimentos foram realizados sem circulação extracorpórea, com auxílio de estabilizador coronário. O único paciente que não apresentava aorta gravemente aterosclerótica não dispunha de enxertos suficientes, uma vez que se tratava de reoperação. Houve consentimento dos pacientes na participação do estudo.

Foi realizada ponte coronária-coronária na artéria coronária direita exclusivamente, utilizando segmento da veia safena magna, com sutura contínua de polipropilene 7-0, proximal e distal. O tempo de seguimento variou de 3 a 5 anos até o momento, sendo o acompanhamento realizado com eletrocardiograma, ecodopplercardiograma e cintilografia de perfusão miocárdica anualmente. Não consideramos necessária a realização de cinecoronariografia na ausência de sintomas ou alterações sugestivas de isquemia em exames subsidiários.


RESULTADOS

Não houve qualquer intercorrência intra ou pósoperatória. Também não houve nenhum óbito. Apenas um dos pacientes apresentou sinais de isquemia após quatro anos da operação, manifestado por angina instável, sendo submetido à cinecoronariografia que demonstrou ponte coronária-coronária livre de lesões (Figura 1) e obstrução em 70% de ramo marginal não acometido anteriormente à operação. Os demais pacientes mantiveram-se assintomáticos, sem sinais eletrocardiográficos ou de imagem de isquemia recente.


Fig. 1 - Enxerto coronário-coronário pérvio após quatro anos de pós-operatório



DISCUSSÃO

O acidente vascular cerebral se apresenta como importante causa de morbidade no pós-operatório de cirurgia cardíaca, especialmente em pacientes portadores de aorta gravemente aterosclerótica [1,4]. Esta condição é encontrada com mais frequência em pacientes idosos. Segundo estimativa da Sociedade Americana de Cirurgia Torácica, cerca de um terço dos pacientes submetidos a revascularização do miocárdio têm mais de 70 anos [5].

Existem diversas maneiras de evitar a manipulação da aorta ascendente no caso da aorta em porcelana. A canulação da artéria axilar ou femoral associada à indução de fibrilação ventricular, evitando o pinçamento da aorta; o uso de outros locais para anastomose proximal, como uma artéria coronária ou outra ponte; a operação sem circulação extracorpórea e a combinação entre estas técnicas são as principais estratégias disponíveis [1-3,5].

A ponte coronária-coronária foi descrita pela primeira vez por Rowland e Grooters [6], em 1987, em dois casos, sendo um com aorta em porcelana e outro por escassez de enxertos. Nos dois pacientes foi utilizada a veia safena magna como enxerto. Além dos casos de aorta em porcelana, também pode ser realizada quando houver estenose ou oclusão da artéria subclávia ou ainda insuficiência de enxertos. Korkmaz et al. [7] sugerem como outras indicações para a ponte coronária-coronária o fluxo inadequado ou a lesão inadvertida da artéria torácica interna pediculada, além de situações nas quais o uso da artéria torácica interna representa aumento significativo da morbidade. Esta, quando utilizada em pacientes diabéticos insulinodependentes, idosos, portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica ou obesos, pode ser fator predisponente para infecções do mediastino ou respiratórias.

A maioria dos relatos apresenta a diversidade de possibilidade das pontes coronária-coronária. Todas as artérias são passíveis deste tipo de revascularização, embora a artéria coronária direita tenha importância especial, conferida por sua localização superficial, acesso fácil e frequente ausência de aterosclerose em seu segmento próximo ao óstio. Nessa situação, enxertos venosos poderiam ter patência comparável ao uso de enxertos arteriais [7-9]. Neste estudo, o baixo tempo de seguimento ainda não permite tal comparação.

Korkmaz et al. [7] preconizam o uso da artéria torácica interna, sendo o enxerto utilizado em todos os pacientes de sua amostra, inclusive naqueles com lesão única na artéria coronária direita. Salientam a facilidade técnica e a reconhecida patência a longo prazo. Além disso, estaria menos sujeita a espasmo do que outros enxertos arteriais, como a artéria gastroomental ou radial. No presente estudo, os autores optaram pelo uso da veia safena magna em todos os casos e os resultados iniciais são semelhantes aos da literatura.

A ponte coronária-coronária pode ser realizada tanto em dois segmentos da mesma artéria como em artérias diferentes. A patência a longo prazo, embora haja poucos relatos a respeito, parece ser excelente. Mariscalco et al. [8] relataram caso em que uma ponte de veia safena magna, feita entre dois segmentos da artéria coronária direita, se encontrava pérvia após 19 anos de pós-operatório. Biglioli et al. [9] ressaltaram que o fluxo através da ponte coronáriacoronária seria mais fisiológico, uma vez que ocorre durante a diástole. Essa situação ocasiona pressão menor dentro do enxerto comparada àquela posicionada na aorta e poderia justificar a condição hemodinâmica favorável a sua patência prolongada.


CONCLUSÃO

A partir dos dados observados pelos autores e dos relatos obtidos na literatura, foi possível concluir que a ponte coronária-coronária tem resultados encorajadores, constituindo opção viável e satisfatória para pacientes submetidos à revascularização do miocárdio, em especial portadores de aorta em porcelana, estenose ou obstrução da artéria subclávia e em reoperações com escassez de enxertos.


REFERÊNCIAS

1. Erdil N, Ates S, Demirkilic U, Tatar H, Sag C. Coronary-coronary bypass using vein graft on a beating heart in a patient with porcelain aorta. Tex Heart Inst J. 2002; 29(1): 54-5. [MedLine]

2. Silva AMRP, Campagnucci VP, Pereira WL, Rosa RF, Franken RA, Gandra SMA, et al. Revascularização do miocárdio sem circulação extracorpórea em idosos: análise da morbidade e mortalidade. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2008; 23(1): 40-5. [MedLine] Visualizar artigo

3. Lima R, Diniz R, Césio A, Vasconcelos F, Gesteira M, Menezes A, et al. Revascularização miocárdica em pacientes octogenários: estudo retrospectivo e comparativo entre pacientes operados com e sem circulação extracorpórea. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2005; 20(1): 8-13. Visualizar artigo

4. Uva MS, Pedro A, Caria R, Mesquita A, Bau J, Pinho J, et al. Coronary surgery in patients with porcelain aorta. Rev Port Cardiol. 2002; 21(6): 769-80. [MedLine]

5. Ricci M, Karamanoukian HL, D'Ancona G, Bergsland J, Salerno TA. Coronary artery bypass grafting in the presence of atheromatous or calcified aorta: on-pump or off-pump? Heart Surg Forum. 2000; 3(1): 12-4. [MedLine]

6. Rowland PE, Grooters RK. Coronary-coronary artery bypass: an alternative. AnnThorac Surg. 1987; 43(3): 326-8.

7. Korkmaz AA, Onan B, Tamtekin B, Oral K, Aytekin V, Bakay C. Right coronary revascularization by coronary-coronary bypass with a segment of internal thoracic artery. Tex Heart Inst J. 2007; 34(2): 170-4. [MedLine]

8. Mariscalco G, Blanzola C, Leva C, Bruno VD, Luvini M, Sala A. 19-year patency of a coronary-coronary venous bypass graft. Tex Heart Inst J. 2005; 32(4): 583-5. [MedLine]

9. Biglioli P, Alamanni F, Antona C, Sala A, Susini G. Coronary-coronary bypass: theoretical basis and techniques. J Cardiovasc Surg (Torino). 1987; 28(3): 333-5. [MedLine]

Article receive on domingo, 18 de janeiro de 2009

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