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ARTIGO ORIGINAL

Resultados da implementação de modelo organizacional de um serviço de cirurgia cardiovascular

Fernando A AtikI; Maria Fernanda M. A GarciaII; Linda Maria SantosIII; Renato B ChavesIII; Cristiano N FaberI; Ricardo B CorsoI; Nubia W VieiraIV; Luiz Fernando CaneoV

DOI: 10.1590/S0102-76382009000200005

INTRODUÇÃO

Mudanças no perfil de pacientes com doença cardíaca estrutural têm sido observadas nas últimas décadas, reflexo da maior longevidade da população geral e do aumento da gravidade daqueles encaminhados para tratamento cirúrgico [1]. Consequentemente, a maior demanda de atendimento em volume e em gravidade exige das unidades hospitalares e dos profissionais envolvidos no atendimento maior eficiência, com o intuito de manter a mesma qualidade.

Neste sentido, o desenvolvimento tecnológico da medicina tem permitido que operações cardiovasculares de alta complexidade sejam conduzidas com segurança, e com resultados progressivamente melhores em centros de excelência mundiais [2-4]. Fatores institucionais e pessoais estão envolvidos nestes bons resultados, e incluem incorporação de novos métodos diagnósticos e terapêuticos menos invasivos, melhorias no tratamento clínico, na indicação e no planejamento cirúrgico, maior experiência e sistematização da cirurgia e da anestesia e melhor entendimento do cuidado pós-operatório. Assumem especial relevância a formação e manutenção de equipes multiprofissionais integradas e a realização do controle de qualidade local, os quais constituem o alicerce dos programas de cirurgia cardiovascular de excelência [5].

Programas de controle de qualidade objetivam a adequação das unidades hospitalares e dos profissionais envolvidos, no sentido de proporcionar as melhores condições possíveis de atendimento médico. Com isto, minimiza-se a influência de fatores organizacionais nos resultados cirúrgicos, restando apenas o erro humano da equipe [6] e os fatores individuais vinculados ao paciente, como, por exemplo, o nível socioeconômico, a gravidade da doença e as suas comorbidades [7,8].

Apesar de ser extremamente importante para o desenvolvimento da prática médica nas diversas especialidades, a literatura encontra-se escassa de publicações que visem ao aspecto organizacional hospitalar e seu controle de qualidade. Poucas evidências correlacionam medidas integradas de atendimento aos resultados após a cirurgia cardíaca [9-11], o que estimula a ampla discussão do tema, em face da crescente transparência dos resultados de procedimentos médicos ao público leigo [12] e da consequente tendência do pagamento baseado em parâmetros como qualidade e desempenho [13].

O objetivo deste trabalho é examinar o impacto, em curto prazo, da adoção de um modelo organizacional de um serviço de cirurgia cardiovascular nos resultados cirúrgicos.


MÉTODOS

No período de janeiro de 2006 a junho de 2007, 367 pacientes adultos consecutivos foram submetidos à cirurgia cardiovascular e incluídos no estudo, sem critérios de exclusão. As variáveis pré, intra e pós-operatórias foram colhidas prospectivamente e armazenadas em banco de dados computadorizado institucional, aprovado para pesquisa clínica pela Comissão de Ética em Pesquisa.

Características da unidade hospitalar e histórico da criação do modelo organizacional

O Instituto do Coração do Distrito Federal (InCor-DF) foi criado por meio de um convênio firmado entre Fundação Zerbini, Ministério da Defesa, Câmara dos Deputados e Senado Federal. O projeto foi iniciado no início de 2003, período em que foram formulados os planos diretores de cada uma das áreas hospitalares, com protocolos de conduta clínica semelhantes aos praticados no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. A maioria da equipe médica foi formada nesta última instituição. O InCor-DF é um hospital terciário composto por 100 leitos, destinado ao atendimento de pacientes de alta complexidade em cardiologia do sistema único de saúde e de convênios privados. O hospital foi aberto para atendimento em novembro de 2004, sendo a primeira cirurgia pediátrica realizada em fevereiro de 2005 e o primeiro procedimento cirúrgico realizado em adulto em maio de 2005. O volume de procedimentos cirúrgicos foi aumentando progressivamente ao longo do tempo (Figura 1).


Fig. 1 - Número de pacientes adultos operados no InCor - DF por ano desde a primeira cirurgia cardíaca em paciente adulto, em maio de 2005



Formação profissional, técnica e pessoal, de longa duração em diversas instituições brasileiras e estrangeiras (FAA, CNF) permitiram a criação de uma visão de atendimento própria, incorporando características positivas de cada serviço e procurando minimizar suas deficiências. Entre 10 e 30 de julho de 2006, foi realizado o diagnóstico situacional dos problemas do serviço no InCor-DF, conhecendo seus dados profundamente, além da observação in locu das discussões clínicas pré-operatórias, da execução dos procedimentos cirúrgicos, da condução da anestesia e da circulação extracorpórea e do atendimento pós-operatório. Em posse desses dados, foi emitido um relatório em relação aos problemas identificados (Quadro 1) e criado um plano de mudanças estruturais de atendimento, que se iniciou em agosto de 2006. Os resultados da implementação do plano de ação foram avaliados a partir de setembro de 2006 (Figura 2).




Fig. 2 - Linha temporal do trabalho, incluindo a definição dos grupos estudados



Características do modelo organizacional

Embora existam características concretas que possam ser mensuradas facilmente por meio de protocolos de conduta médica embasados em evidências clínicas bem estabelecidas; outras são genéricas, subjetivas e mais difíceis de serem mensuradas. Como premissa deste modelo, todos os integrantes da equipe médica trabalhavam, no momento deste estudo, em regime de dedicação exclusiva. A implementação das medidas não implicou em aumento dos custos hospitalares. As principais características do modelo organizacional proposto estão listadas a seguir:

1. Atendimento médico centrado no paciente: todos os integrantes da equipe, independentemente de seus interesses pessoais, devem visar ao paciente em primeiro lugar. Isso inclui todas as áreas multiprofissionais que lidam com o atendimento. Nenhum membro da equipe é mais importante do que o outro. Incutir nos profissionais a noção de equipe, dividindo os sucessos e os insucessos com todos;

2. Desenvolvimento e aplicação de protocolos de atendimento por meio de medicina baseada em evidências (Quadro 2). Revisão periódica desses protocolos de acordo com novas evidências de literatura e/ou necessidades do serviço;

3. Visitas multiprofissionais diárias no pós-operatório, decisões em equipe. Todas as intercorrências relevantes são valorizadas e conduzidas em conjunto, independentemente do horário e dia da semana;

4. Resolução de conflitos interpessoais na equipe: valorização das virtudes de cada um, potencializando-as em prol da equipe. Vigilância constante dos conflitos e resolução dos mesmos assim que detectados;

5. Criação de banco de dados institucional, com extração periódica desses dados, a fim de identificar precocemente os problemas, entender suas causas e as potenciais formas de correção. Criação de um grupo multiprofissional de controle de qualidade dentro da instituição que seja responsável pelo gerenciamento e extração dos dados. Todas as fases do atendimento devem ser envolvidas, desde o ambulatório, unidade de emergência, centro cirúrgico, até a terapia intensiva.

6. Ensino e pesquisa. Reuniões periódicas de morbidade e mortalidade. Pesquisa clínica aplicada para as necessidades do serviço. Disseminação de conhecimento por meio da formação de novos profissionais (programas de residência médica e de especialização em enfermagem e fisioterapia em cardiologia).




Desfechos estudados

Os desfechos estudados neste trabalho foram mortalidade hospitalar e eventos combinados, definido por qualquer combinação de dois ou mais eventos de óbito, acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio e insuficiência renal aguda.

Mortalidade hospitalar foi definida como óbito por qualquer causa ocorrido após o procedimento cirúrgico durante a mesma internação ou até 30 dias após a alta hospitalar.

Acidente vascular cerebral foi definido por lesão cerebral focal identificada por exame neurológico realizado por especialista e confirmado por tomografia computadorizada ou ressonância magnética de crânio. Foram excluídas alterações neurocognitivas, estados confusionais ou alterações psicológicas, desde que não associadas a lesões focais.

Infarto do miocárdio pós-operatório foi definido por elevação da enzima creatinoquinase miocárdica específica superior a 10 vezes o valor de referência (normal até 4 UI/L) associado a pelo menos um dos critérios a seguir: aparecimento de novas ondas Q patológicas ou novo bloqueio de ramo esquerdo ao eletrocardiograma e novas alterações de contração segmentar ao ecocardiograma.

Insuficiência renal aguda foi definida pela necessidade de terapia dialítica (hemodiálise ou hemofiltração) no pós-operatório em pacientes que não faziam uso desta terapêutica previamente.

Análise estatística

As variáveis categóricas foram expressas por meio de frequências e porcentagens e as contínuas por meio de médias e desvio padrão. As variáveis contínuas com distribuição heterogênea foram expressas por meio de medianas e intervalos de confiança referentes a um desvio padrão. Na comparação das características pré e intra-operatórias e dos eventos de morbidade e mortalidade entre os grupos, os testes qui-quadrado, exato de Fisher, t de Student e Wilcoxon foram utilizados, quando indicados. Regressão logística multivariada foi utilizada na determinação dos fatores de risco de óbito e dos eventos combinados, tendo sido criados dois modelos para cada um dos desfechos.

Variáveis significativamente (P<0,05) relacionadas com cada um dos eventos por meio de análise univariada foram retidas. A seguir, regressão logística stepwise backward foi usada na construção dos modelos multivariados. A calibração e a discriminação dos modelos foram determinadas pelo teste de Hosmer-Lemeshow e pela análise da curva ROC (receiver-operating characteristic), respectivamente.


RESULTADOS

Características pré-operatórias


As características pré-operatórias dos pacientes em ambos os grupos estão demonstradas na Tabela 1. Devido ao perfil do estudo, os grupos exibiram distinções em algumas variáveis pré-operatórias. Pacientes do grupo A eram mais propensos à presença de doença pulmonar crônica (28% versus11%; P<0,0001) e infarto do miocárdio prévio (39% versus 25%; P=0,02). Por outro lado, pacientes do grupo B apresentavam-se mais frequentemente em classes funcionais I e II, enquanto que os do grupo A em classes funcionais II e III (P<0,0001).




Os grupos foram considerados comparáveis em relação a variáveis pré-operatórias importantes, tais como sexo (P=0,73), idade (P=0,08), fração de ejeção (P=0,71) e o EuroSCORE logístico (P=0,13) e aditivo (P=0,48), dentre outras.

Características intra-operatórias

Os grupos foram semelhantes em relação ao tipo de operação realizada (Tabela 2). Houve redução significativa no tempo de pinçamento aórtico no grupo B (86 ± 47 versus 98 ± 48; P=0,01), reflexo de uma série de modificações almejando maior sistematização dos procedimentos cirúrgicos. Embora houvesse minimização da duração da circulação extracorpórea, esta não foi significativa.




Impacto do modelo organizacional nos resultados cirúrgicos

A morbidade e a mortalidade pós-operatórias estão expressas na Tabela 3. Após a adoção do modelo, houve redução da mortalidade hospitalar (de 12% para 3,6%, risco relativo= 0,3; P=0,003) e de eventos combinados (de 22% para 15%, risco relativo= 0,68; P=0,11). Quando as morbidades foram analisadas individualmente, observaram-se reduções não significativas na revisão cirúrgica de hemostasia (de 9,8% para 6,2%; P=0,2), acidente vascular cerebral (de 4,6% para 3,1%; P=0,44), necessidade de hemodiálise (de 5,8% para 2,6%; P=0,12) e uso de balão intra-aórtico (de 15% para 9,8%; P=0,13). Contudo, o implante de marca-passo definitivo pós-cirúrgico aumentou significativamente no grupo B (3,6% versus 0,5%, P=0,03).




Operações realizadas anteriormente à implementação do modelo estiveram associadas independentemente com maior mortalidade (OR=2,5; P=0,04), assim como a idade superior a 65 anos (OR=6,36; IC95% 2,57 - 17,21; P<0,0001) e o tempo de circulação extracorpórea superior a 145 minutos (OR=8,57; IC95% 3,55 - 21,99; P<0,0001), conforme detalhado na Tabela 4.




Os fatores de risco para a ocorrência de eventos combinados foram idade superior a 65 anos (OR=3,35; IC95% 1,91 - 5,99; P<0,0001) e o tempo de circulação extracorpórea superior a 145 minutos (OR=3,81; IC95% 1,11 - 6,95; P<0,0001).


DISCUSSÃO

Achados principais


Neste estudo, demonstrou-se que a implementação de modelo organizacional caracterizado, fundamentalmente, pelo atendimento multiprofissional em equipe, centralizado no paciente, e com condutas padronizadas levou a importante melhora dos resultados cirúrgicos. Deve-se salientar que a drástica mudança nos resultados foi alcançada rapidamente, fruto de dedicação, comprometimento e adesão da equipe ao modelo de atendimento e às medidas propostas.

Houve redução de quase quatro vezes na mortalidade hospitalar, sendo o período de tempo anterior à implementação do modelo um fator de risco independente de morte, assim como a idade avançada e o tempo de circulação extracorpórea prolongado. Estes últimos já são reconhecidos fatores de risco identificados em outros estudos [7,14]. Apesar de não ter sido significativa, a redução de eventos combinados foi de aproximadamente 30%, assim como da revisão de hemostasia, acidente vascular cerebral e necessidade de balão intra-aórtico. Houve uma redução de 55% na necessidade de hemodiálise após a adoção do modelo. Esteve particularmente implicada na melhoria destes resultados a padronização de atendimento pós-operatório, caracterizada por correção precoce dos estados de choque monitorizado por parâmetros de perfusão tecidual, normatização no uso de drogas vasoativas, reposição volêmica adequada, evitando-se doses elevadas de diuréticos, minimização da transfusão de hemocomponentes, extubação precoce e controle rigoroso da glicemia (Quadro 2).

Deve-se salientar que estes resultados refletem apenas o início de um programa de controle de qualidade, cujo trabalho é contínuo. A implementação de base de dados institucional tem sido fundamental na monitorização destes resultados temporalmente, sendo um importante instrumento de avaliação das deficiências do sistema operacional, assim como do próprio cirurgião. Morbidade deve obrigatoriamente estar incluída como indicador de qualidade em cirurgia cardíaca, além da mortalidade ajustada ao risco cirúrgico.

Realidade do Brasil

Os resultados aqui apresentados não são superponíveis àqueles de grandes centros do primeiro mundo. Na realidade, sabe-se que os resultados da cirurgia cardíaca praticados no Brasil não são comparáveis aos dos países desenvolvidos [8], apesar das bases de dados brasileiras disponíveis não contemplarem uma análise detalhada dos escores de risco operatório e refletirem somente os pacientes do Sistema Único de Saúde [7]. É inquestionável que a realidade da cirurgia cardíaca brasileira é peculiar por características individuais e de organização do sistema de saúde. Portanto, deve-se ter cautela ao adotar práticas amplamente empregadas nos Estados Unidos e Europa, pois são baseadas em estudos conduzidos nestes locais, e não necessariamente refletem as particularidades brasileiras [15].

Grande parte da população, de baixo nível socioeconômico, depende de um sistema público de saúde deficitário. Diagnóstico e tratamento tardios são frequentes, o que aumenta o risco cirúrgico, pois os pacientes se apresentam já em fases avançadas da doença. A defasagem entre a quantidade de investimento governamental e a demanda crescente da cirurgia cardíaca é evidente, além das dificuldades de pagamento dos procedimentos pelo governo. Neste sentido, profissionais com remuneração inadequada, com condições inapropriadas de trabalho, obviamente são desestimulados a implementar a qualidade do atendimento.

Deve-se ressaltar que o nosso serviço não apresenta as limitações estruturais próprias da realidade brasileira. A construção do hospital foi financiada pelo governo federal, sendo equipado à semelhança dos melhores hospitais privados do país. Além disso, os profissionais médicos trabalhavam em regime de dedicação exclusiva no momento da implementação do modelo organizacional, o que dificilmente acontece em outros locais, favorecendo, sem dúvida, a melhoria da qualidade da assistência.

Qualidade em cirurgia cardíaca

Stamou et al. [11] demonstraram que programas de controle de qualidade levam à redução significativa da mortalidade hospitalar em cirurgia cardíaca. Apesar das medidas implementadas variarem de acordo com o hospital, cujas rotinas são inerentes às suas realidades, o objetivo de todos os programas institucionais seria de melhorar a qualidade da assistência. Isto consequentemente melhoraria os resultados e abreviaria os custos hospitalares relacionados à morbidade elevada. A eficácia de tais programas está embasada na normatização de condutas dentro do hospital, independente de preferências individuais, no trabalho em equipe, no atendimento centralizado no paciente, na comunicação consistente e efetiva entre os profissionais e na abertura para mudanças de conduta.

A formação do programa de cirurgia cardiovascular aqui proposto não tem a pretensão de determinar dogmas de conduta que sejam adotados em outros serviços, nem tão pouco exercer grau de superioridade em relação a outros programas brasileiros que funcionam bem há muito mais tempo. Provavelmente, muitos dos centros brasileiros já utilizam boa parte das mesmas características aqui apresentadas, porém talvez não de forma tão sistematizada e integrada. Reuniões de morbidade e mortalidade são muito importantes e devem ser conduzidas de maneira construtiva [16]. Da mesma forma, a pesquisa clínica aplicada também tem importância fundamental na detecção dos problemas do serviço e na mudança de condutas. A educação continuada e os programas de residência médica e aperfeiçoamento multiprofissional são essenciais para a manutenção da qualidade, disseminação do conhecimento e manutenção da motivação da equipe.

No entanto, existem fatores humanos dinâmicos que fogem muitas vezes ao nosso controle, tais como mudança de rodízio dos residentes [17], nível de treinamento da enfermagem [18] e excessivas horas de trabalho dos profissionais.

Iniciativas do estado e das sociedades médicas especializadas

A monitorização dos resultados da cirurgia cardíaca é realizada por vários órgãos públicos em países desenvolvidos, por meio de bases de dados voluntárias ou mandatórias, e constituem o principal instrumento de conhecimento da realidade da especialidade. Recentemente, The Society of Thoracic Surgeons (Estados Unidos) criou um comitê executivo de controle de qualidade dos serviços de cirurgia cardiovascular, que tem como objetivo detalhar a situação atual dos programas, identificar possíveis desvios da prática médica considerada ideal, e propor intervenções que possam implementar o sistema localmente [19]. A regulação do estado sobre o funcionamento do setor já é uma realidade no Canadá [20], onde alguns postulam que doenças que tenham frequência baixa e heterogeneidade de apresentação devam ser triadas para centros de excelência que possam oferecer melhores formas de tratamento que outros, um conceito de regionalização do atendimento baseado no desempenho [15].

No Brasil, como os resultados são dependentes da estrutura e alocação de recursos materiais e humanos, é fundamental que haja uma revisão dos investimentos governamentais nos hospitais credenciados para fins de ampliação, modernização, treinamento e aperfeiçoamento de pessoal. Deve-se criar, conjuntamente com a sociedade específica, uma política nacional de atendimento de alta complexidade que requer requisitos mínimos, tanto institucionais quanto profissionais, assim como número mínimo de procedimentos. Formação de um banco de dados nacional está em andamento [7].

Limitações do estudo

As limitações deste estudo são inerentes à natureza retrospectiva. Os grupos não eram comparáveis em relação a uma série de características pré-operatórias, e eram temporalmente distintos. Não se pode excluir que a melhora dos resultados pudesse estar associada a aumento da experiência do serviço e não somente a implementação do modelo. No entanto, vale ressaltar que a equipe de liderança envolvida neste processo já possuía treinamento e experiência acerca do assunto, adquirida em centros de referência nacional e internacional.

Outros fatores de risco classicamente relacionados a maior mortalidade como, por exemplo, sexo feminino, diabetes, disfunção ventricular, reoperações, classe funcional avançada e EuroSCORE não obtiveram significância estatística provavelmente pelo número limitado de pacientes neste estudo.


CONCLUSÕES

A responsabilidade final sobre o sucesso ou o insucesso da evolução do paciente cirúrgico recai primordialmente sobre o cirurgião. Apesar de alguns fatores organizacionais desfavoráveis muitas vezes fugirem à alçada deste profissional, estes fatores sem dúvida exercem impacto direto sobre os resultados. Em vista destas peculiaridades, existe uma necessidade premente de envolvimento das sociedades especializadas, principalmente no que diz respeito à monitorização dos resultados cirúrgicos, cobrança por melhores condições de trabalho e investimento em capacitação profissional e pesquisa aplicada à prática diária.

O controle de qualidade da equipe cirúrgica depende do envolvimento de todos e trata-se de um processo dinâmico e ininterrupto, incansável, envolvendo frequente necessidade de reavaliação e readequação. Ressalta-se neste contexto a importância inequívoca do trabalho em equipe e de todo um processo de abertura a mudanças, frente ao qual sempre podem existir resistências e interesses pessoais. Cabe aos líderes responsáveis pela implementação do modelo organizacional, a responsabilidade por todo um trabalho de quebra de paradigmas, em prol de um bem maior, a saúde dos seus pacientes.

Conclui-se que a rápida melhora dos resultados cirúrgicos depende da composição de serviços de cirurgia cardíaca embasados em modelos organizacionais semelhantes ao proposto.


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Article receive on terça-feira, 20 de janeiro de 2009

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