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COMUNICAÇÃO BREVE

Trajeto extrapleural, para-hilar da artéria torácica interna esquerda pediculada nos enxertos coronarianos

Hermes de Souza FelippeI; Marco CunhaI; Eduardo Sérgio BastosI; Marcos Floripes da SilvaII

DOI: 10.5935/1678-9741.20120109

RESUMO

Variante técnica relacionada ao posicionamento da artéria torácica interna esquerda pediculada extrapleural e para-hilar, evitando aderências ao mediastino anterior e protegendo o enxerto de possíveis lesões durante eventuais reoperações.

ABSTRACT

The positioning of the internal thoracic artery extra-pleural and perihilar in coronary artery bypass grafting to avoiding anterior aderences and prevent unnecessary damage arterial.

ABREVIAÇÕES E ACRÔNIMOS

ATIE: Artéria torácica interna esquerda

CEC: Circulação extracorpórea

RM: Revascularização do miocárdio

UTI: Unidade de terapia intensiva

INTRODUÇÃO

A artéria torácica interna esquerda (ATIE) é considerada "padrão ouro" em relação à perviabilidade em comparação aos demais enxertos. O aprimoramento técnico e a melhora dos fatores socioeconômicos têm proporcionado aumento da sobrevida dos pacientes submetidos à revascularização do miocárdio (RM), consequentemente, tornando-os sujeitos a novas toracotomias para neorevascularizações ou para correções de outras comorbidades cardiocirúrgicas. As reoperações são procedimentos com maior risco de complicações e acidentes, entre estas, as lesões de enxertos.

A posição adotada pela ATIE na cavidade torácica pode ter influência direta nas complicações imediatas e tardias. Tardiamente, as aderências subesternais podem englobar o enxerto, tornando-o vulnerável a vários tipos de traumas durante as reintervenções.

Eventuais lesões durante novas toracotomias levaram os autores a utilizarem um método simples, facilmente reprodutível, em que a ATIE é posicionada extrapleural, posterior e para-hilar, de modo a mantê-la ao longo do mediastino, protegida pelas estruturas adjacentes, evitando a maioria dessas complicações.

A ATIE origina-se da primeira porção da borda inferior da artéria subclávia esquerda em mais de 90% dos casos. O nervo frênico cruza anteriormente a emergência da mamária em cerca de 70% dos casos, o restante cruza a região posterior em direção ao pericárdio [1]. Inicialmente repousa sobre a região anterior e apical da pleura, direcionando-se na face interna da parede torácica e por trás das seis cartilagens costais superiores, dos músculos intercostais internos e lateralmente à borda esternal. Em todo o trajeto, mantém contato íntimo com a pleura parietal até ser encoberta no segmento distal pelo músculo transverso do tórax. Os principais ramos da ATIE são as artérias pericardiofrênica, intercostais e perfurantes. Termina na altura do sexto espaço intercostal, dividindo-se, na maioria das vezes, em dois ramos terminais, as artérias epigástrica superior e musculofrênica.

A dissecção cuidadosa da artéria, evitando a transmissão de calor pelo eletrocautério e a formação de hematomas, laqueaduras dos ramos causando constrições e redução de seu manuseio são medidas importantes para preservar sua patência. Da mesma forma, o posicionamento adequado, evitando torções, angulações, compressões e estiramentos, é complemento importante para a sua perviabilidade [2]. Anastomoses com fios e agulhas mais adequados e melhor entendimento das alterações hemodinâmicas decorrentes das lesões nos vasos nativos têm dado aos pesquisadores subsídios para adequar uma abordagem que visa manter a perviabilidade desses enxertos por mais tempo. Essas observações têm contribuído para redução das falhas do procedimento e, consequentemente, do número de reoperações [3].

As reoperações apresentam risco adicional às complicações. Coltharp et al. [4] relataram incidência aproximada de 5% (5/97 casos) de lesões arteriais durante reoperações em procedimentos em que a ATIE foi utilizada previamente. Atualmente, por meio de avaliações angiotomográficas, tem-se estudado o mediastino anterior e a localização dos enxertos em relação ao gradil costal, estabelecendo critérios de risco, permitindo uma programação cirúrgica dirigida, com riscos mais atenuados [5].

 

DESENVOLVIMENTO DA TÉCNICA

As técnicas utilizadas para a desinserção da ATIE têm evoluído substancialmente com a modernização dos equipamentos que permitem sua melhor exposição e, em especial, os dissectores que disponibilizam energia mais efetiva e localizada.

A técnica mais utilizada nas dissecções da ATIE é a abertura ampla da pleura parietal adjacente ao seu trajeto, desinserção do leito com laqueadura dos ramos e fenestração pleuropericárdica anterior ao nervo frênico, para permitir seu acesso à cavidade pericárdica.

A dissecção da ATIE com a manutenção da integridade pleural é mais elaborada e susceptível a grau maior de intercorrências, especialmente quando a artéria apresenta comprimento limitado, o que a torna mais vulnerável a estiramentos durante os movimentos respiratórios e, tardiamente, às aderências subesternais.

Mais recentemente, tem-se relatado a dissecção da ATIE com preservação da integridade pleural por meio de técnicas robóticas [6]. Embora promissora, ainda é inviável em muitos centros, em decorrência dos custos dos equipamentos e reprodutibilidade do treinamento.

A preocupação em preservar a pleura sem comprometer a eficiência do enxerto é que nos levou a buscar métodos que aliassem segurança no posicionamento e adequado comprimento que evitassem, assim, complicações imediatas e tardias inerentes à técnica.

 

TÉCNICA OPERATÓRIA

A tática empregada consta do deslocamento lateral e cuidadoso da pleura parietal adjacente à ATIE expondo todo o seu trajeto. A dissecção da artéria é realizada englobando todo o tecido perimamário "no touch" entre duas incisões paralelas. Todos os ramos são clipados, seccionados e a mamária inicialmente mantida no leito até a instalação da circulação extracorpórea (CEC).

O pericárdio é aberto longitudinalmente, os vasos da base e o coração são expostos. Procede-se à confecção das bolsas para instalação da CEC, quando utilizada, seguida da heparinização.

Mantendo-se a pleura íntegra, o preparo do trajeto é realizado iniciando-se com a tração da borda esquerda do pericárdio expondo sua gordura junto à reflexão pleural que é deslocada. A liberação do pericárdio da pleura é realizada facilmente pela contratração da pleura, que se acha aderida através de finas traves de tecido conjuntivo frouxo (Figura 1). A liberação da pleura se faz em direção ao hilo pulmonar e anterior ao nervo frênico, seguindo em direção à reflexão do pericárdio na aorta. Nesta região e mais posteriormente, a gordura lateral do mediastino é frouxa e está em continuidade com a da região do ápice pleural.

 

 

O segmento proximal da ATIE repousa sobre a pleura, que deve ser cuidadosamente deslocada, liberando-se o vaso. A região abaixo da veia subclávia é preenchida por tecido adiposo em continuidade com a pleura apical e facilmente divulsionada em direção ao mediastino, construindo-se um leito para um novo trajeto da ATIE. A gordura junto ao mediastino em continuidade com a região da divulsão pleuropericárdica deve ser preferentemente tunelizada ou seccionada para passagem do enxerto (Figura 2).

 

 

Após a secção distal da ATIE, seu fluxo é avaliado e a extremidade clipada. A artéria é cuidadosamente deslocada através da região apicopleural, sob a gordura mediastínica, de modo a posicionar-se ao longo da região divulssionada. Realiza-se uma incisão no pericárdio na projeção da aurícula esquerda e, através desta, a ATIE alcança a cavidade pericárdica (Figura 3).

 

 

O comprimento do enxerto se ajusta facilmente às revascularizações propostas, incluindo exposições de segmentos intermediários para utilização em anastomoses sequenciais ou em adição a enxertos pediculados.

Ao término da cirurgia, a ATIE repousa confortavelmente sobre o epicárdio, proporcionando um comprimento adequado à revascularização de um ou mais vasos (Figura 4).

 

 

Essa técnica permite que o pericárdio possa ser aproximado juntamente com todo o tecido tímico remanescente ficando a ATIE protegida, extrapleural, para-hilar, apoiada sobre o mediastino sem contato com os tecidos anteriores e a face interna da parede torácica.

Em eventuais estudos angiográficos, a ATIE nessa posição apresenta adequado posicionamento e fluxo. Uma avaliação observacional é que a preservação da integridade pleural tem facilitado o desmame do respirador, menor tempo de permanência na unidade de terapia intensiva (UTI), redução substancial de queixas álgicas pelos pacientes e o posicionamento da ATIE também um determinante de melhor patência do enxerto durante este período.

REFERÊNCIAS

1. Henriquez-Pino JA, Gomes WJ, Prates JC, Buffolo E. Estudo anatômico da artéria torácica interna aplicado à cirurgia cardiovascular. Rev Bras Cir Cardiovasc. 1997;12(1):83-8. Visualizar artigo

2. Sabik JF 3rd, Lytle BW, Blackstone EH, Houghtaling PL, Cosgrove DM. Comparison of saphenous vein and internal thoracic artery graft patency by coronary system. Ann Thorac Surg. 2005;79(2):544-51.

3. Spiliotopoulos K, Maganti M, Brister S, Rao V. Changing pattern of reoperative coronary artery bypass grafting: a 20-year study. Ann Thorac Surg. 2011;92(1):40-7.

4. Coltharp WH, Decker MD, Lea JW 4th, Petracek MR, Glassford DM Jr, Thomas CS Jr, at al. Internal mammary artery graft at reoperation: risks, benefits, and methods of preservation. Ann Thorac Surg. 1991;52(2):225-9.

5. Kamdar AR, Meadows TA, Roselli EE,Gorodeski EZ, Curtin RJ, Sabik JF, et al. Multidetector computed tomographic angiography in planning of reoperative cardiothoracic surgery. Ann Thorac Surg. 2008;85(4):1239-45. [MedLine]

6. Jatene FB, Pêgo-Fernandes PM, Anbar R, Gaiotto FA, Barduco MS, Kalil Filho R. Dissecção robótica da artéria torácica interna direita por esternotomia mediana. Arq Bras Cardiol. 2010;94(6):e139-42.

Article receive on quinta-feira, 26 de abril de 2012

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