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EDITORIAL

Escores de risco: cirurgia de revascularização miocárdica com e sem CEC

Enio Buffolo

DOI: 10.5935/1678-9741.20120086

ABREVIAÇÕES E ACRÔNIMOS

EACTS: European Association for Cardiothoracic Surgery

ESC: European Society of Cardiology

EuroSCORE: European System for Cardiac Operative Risk Evaluation

MIDCABG: Minimally Invasive Coronary Artery Bypass Graft

ROC: Receiver Operating Characteristic

STS: Society of Thoracic Surgeons

O trabalho "Com ou sem CEC? Impacto dos escores de risco na cirurgia de revascularização miocárdica" [1], publicado nesta edição, traz excelente contribuição a respeito de aspectos ainda controversos do benefício de se evitar o uso da circulação extracorpórea na revascularização cirúrgica do miocárdio.

Completados agora 30 anos após sua descrição e resultados iniciais em séries sistemáticas de casos [2,3], somente anos mais tarde, a partir de 1995, com a descrição da técnica ainda menos invasiva conhecida como "MIDCABG" (Minimally Invasive Coronary Artery Bypass Graft) [4,5], a alternativa de revascularização miocárdica sem bomba ("off-pump") recebeu consideração especial e foco internacional, passando a ocupar o principal tópico de discussão nos congressos da especialidade.

A contribuição da cirurgia cardíaca brasileira nesse campo foi extensa e reconhecida internacionalmente, demonstrando a exequibilidade da técnica, seus benefícios e, posteriormente, extensão do procedimento por meio de manobras criativas para um grande grupo de pacientes [6-8]. Cumpre ressaltar que essas contribuições foram demonstradas ainda na época em que não se dispunha de estabilizadores, sendo que a facilitação do procedimento era obtida por meio de estabilização farmacológica, manobras cirúrgicas e perfusores [9].

Apesar das intuitivas vantagens em se evitar a revascularização sem circulação extracorpórea, transformando o procedimento em uma toracotomia, existem opiniões controversas quanto à indicação da técnica em diversos cenários clínicos, no que diz respeito a seleção de pacientes, resultados, perviabilidade dos enxertos, benefícios e desvantagens [10-14].

Na realidade, essas controvérsias são alimentadas por viéses na seleção de pacientes, treinamentos inadequados e curva de aprendizado mais longa.

Na literatura compulsada, os dados são comparados em estudos retrospectivos não-randomizados uni ou multicêntricos e os resultados apresentados como vantagens para um ou outro método. São escassos os estudos prospectivos e randomizados, frequentemente com tamanhos de amostra que não permitem conclusões a respeito e que, muitas vezes, trazem mais confusão que esclarecimento.

A abordagem do trabalho em questão é original e criativa, pois utiliza comparações entre as alternativas de revascularização considerando escores de risco conhecidos e aprovados como o Bernstein-Parsonnet e o EuroSCORE (European System for Cardiac Operative Risk Evaluation).

Com base em uma curva ROC (Receiver Operating Characteristic) de risco previsto e observado, o estudo identifica os benefícios da revascularização do miocárdio sem circulação extracorpórea em pacientes de maior risco: 17,75 no Parsonnet (OR 7,4 para um P <0.0001) e > 4,5 no EuroSCORE (OR 5,4 para um P <0,0001).

Os resultados são muito expressivos e conferem à revascularização "off-pump" uma vantagem indiscutível para pacientes de maior risco e não detecta diferenças significativas em pacientes sem comorbidades [15].

Nos últimos "guidelines" da European Society of Cardiology (ESC) e European Association for Cardiothoracic Surgery (EACTS), de 2010, observamos o reconhecimento do procedimento sem extracorpórea como técnica especial e preferencial em pacientes com comorbidades relevantes, particularmente insuficiência renal crônica [16,17].

O estudo dos autores é o primeiro a demonstrar em casuística expressiva que, para se detectar diferenças, temos que acrescentar ao critério de seleção o risco previsto, o que terá grande impacto no planejamento e na seleção da alternativa de revascularização, com repercussão nas estratégias do mundo real. Tem como limitações tratar-se de um estudo retrospectivo, não-aleatório e unicêntrico, mas a casuística com significativa amostragem em ambos os grupos permite admitir que as conclusões são válidas como verdade institucional, não permitindo todavia extrapolar para outros centros nas quais as condições de estrutura e treinamento das equipes possam não ser as mesmas.

Outra observação de importância diz respeito à utilização de escores de risco não atualizados: Bernstein-Parsonnet 2000 e o EuroSCORE logístico I - 1999, sendo que, na atualidade, os mais utilizados são o STS e o EuroSCORE II.

Essa observação, todavia, não invalida a proposta do estudo, que põe em evidência uma constatação de muita qualidade em informação para o mundo real. O que poderia eventualmente mudar se utilizassem o Society of Thoracic Surgeons (STS) risk calculator ou o EuroSCORE II seria o nível de corte e não a contestação dos resultados.

Além disso, o trabalho abre as portas para a introdução de um risco específico para a revascularização do miocárdio sem circulação extracorpórea, que em nossa opinião seria diferente dos riscos disponíveis, que não distinguem situações entre técnicas não similares.

Parabenizo aos autores, que nos oferecem um complemento valioso às suas contribuições anteriores [18,19] e introduzem uma sistemática de avaliação de procedimentos a partir de desvios de curvas ROC, com base em riscos previamente conhecidos.

REFERÊNCIAS

1. Mejía OAV, Lisboa LAF, Puig LB, Moreira LFP, Dallan LAO, Jatene FB. Com ou sem CEC? Impacto dos escores de risco na cirurgia de revascularização miocárdica. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2012;27(4):503-11.

2. Buffolo E, Andrade JC, Succi JE, Leão LE, Cueva C, Branco JN, et al. Revascularização direta do miocárdio sem circulação extracorpórea: descrição da técnica e resultados iniciais. Arq Bras Cardiol. 1982;38(5):365-73. [MedLine]

3. Benetti FJ. Direct coronary surgery with saphenous vein bypass without either cardiopulmonary bypass or cardiac arrest. J Cardiovasc Surg. (Torino). 1985;26(3):217-22.

4. Benetti FJ, Ballester C, Guido S, Doonstra P, Grandjean J. Video assisted coronary bypass surgery. J Card Surg. 1995;10(6):620-5. [MedLine]

5. Calafiore AM, Giammarco GD, Teodori G, Bosco G, D'Annunzio E, Barsotti A, et al. Left anterior descending coronary grafting via left anterior small thoracotomy without cardiopulmonary bypass. Ann Thorac Surg. 1996;61(6):1658-63.

6. Buffolo E, Andrade CS, Branco JN, Teles CA, Aguiar LF, Gomes WJ. Coronary artery bypass grafting without cardiopulmonary bypass. Ann Thorac Surg. 1996;61(1):63-6. [MedLine]

7. Lima RC, Escobar MAS, Lobo Filho JG, Diniz R, Saraiva A, Cesio A, et al. Resultados cirúrgicos na revascularização do miocárdio sem circulação extracorpórea: análise de 3410 pacientes. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2003;18(3):261-7.

8. Lobo Filho JG, Dantas MCBR, Rolim JGV, Rocha JA, Oliveira FM, Ciarline C, et al. Cirurgia de revascularização completa do miocárdio sem circulação extracorpórea: uma realidade. Rev Bras Cir Cardiovasc. 1997;12(2):115-21. Visualizar artigo

9. Rivetti LA, Gandra SM. Initial experience using an intraluminal shunt during revascularization of the beating heart. Ann Thorac Surg. 1997;63(6):1742-7. [MedLine]

10. Sellke FW, DiMaio JM, Caplan RL, Ferguson TB, Gardner TJ, Hiratzka LF; American Heart Association, et al. Comparing on-pump and off-pump coronary artery bypass grafting: numerous studies but few conclusions: a scientific statement from the American Heart Association council on cardiovascular surgery and anesthesia in collaboration with the interdisciplinary working group on quality of care and outcomes research. Circulation. 2005;111(21):2858-64. [MedLine]

11. Puskas JD, Williams WH, Duke PG, Staples JR, Glass KE, Marshall JJ, et al. Off-pump coronary artery bypass grafting provides complete revascularization with reduced myocardial injury, transfusion requirements, and length of stay: a prospective randomized comparison of two hundred unselected patients undergoing off-pump versus conventional coronary artery bypass grafting. J Thorac Cardiovasc Surg. 2003;125(4):797-808. [MedLine]

12. Buffolo E, Lima RC, Salerno TA. Myocardial revascularization without cardiopulmonary bypass: historical background and thirty-year experience. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2011;26(3):III-VII. [MedLine] Visualizar artigo

13. Chu D, Bakaeen FG, Dao TK, LeMaire SA, Coselli JS, Huh J. On-pump versus off-pump coronary artery bypass grafting in a cohort of 63,000 patients. Ann Thorac Surg. 2009;87(6):1820-6.

14. Shroyer AL, Grover FL, Hattler B, Collins JF, McDonald GO, Kozora E, et al. On-pump versus off-pump coronary-artery bypass surgery. N Engl J Med. 2009;361(19):1827-37. [MedLine]

15. Gerola LR, Buffolo E, Jasbik W, Botelho B, Bosco J, Brasil LA, et al. Off-pump versus on-pump myocardial revascularization in low-risk patients with one or two vessels disease: perioperative results in a multicenter randomized controlled trial. Ann Thorac Surg. 2004;77(2):569-73. [MedLine]

16. Sajja LR, Mannam G, Chakravarthi RM, Sompalli S, Naidu SK, Somaraju B, et al. Coronary artery bypass grafting with or without cardiopulmonary bypass in patients with preoperative non-dialysis dependent renal insufficiency: a randomized study. J Thorac Cardiovasc Surg. 2007;133(2):378-88. [MedLine]

17. Caputi GM, Palma JH, Gaia DF, Buffolo E. Off-pump coronary artery bypass surgery in selected patients is superior to the conventional approach for patients with severely depressed left ventricular function. Clinics. (Sao Paulo). 2011;66(12):2049-53.

18. Mejía OA, Lisboa LA, Puig LB, Dias RR, Dallan LA, Pomerantzeff PM, et al. The 2000 Bernstein-Parsonnet score and EuroSCORE are similar in predicting mortality at the Heart Institute, USP. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2011;26(1):1-6. [MedLine] Visualizar artigo

19. Mejia OAV, Lisboa LAF, Dallan LAO, Pomerantzeff PMA, Moreira LFP, Jatene FB, et al. Validação do 2000 Bernstein-Parsonnet e EuroSCORE no Instituto do Coração - USP. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2012;27(2):187-94. [MedLine] Visualizar artigo

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