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RELATO DE CASO

Pseudoaneurisma de aorta como causa de síndrome da veia cava superior: relato de caso

Katsuro Harada JúniorI; Renato Garcia Lisboa BorgesII; Renata Kiyoko Borges HaradaIII

DOI: 10.5935/1678-9741.20120081

RESUMO

A síndrome da veia cava superior representa o conjunto de sinais e sintomas decorrentes da sua obstrução. A síndrome tem como principais etiologias tumores malignos, como o carcinoma broncogênico, o linfoma e a metástase mediastinal. O câncer de pulmão é responsável por 80% dos casos, os linfomas mediastinais por 15%, e 5% correspondem às demais causas. Este relato de caso objetiva apresentar um caso incomum dessa síndrome, ocorrido em um paciente do sexo masculino após ferimento penetrante no tórax, resultando em pseudoaneurisma de arco aórtico e a síndrome da veia cava superior.

ABSTRACT

The superior vena cava syndrome represents the set of signs and symptoms resulting from obstruction of superior vena cava. The syndrome has as main causes malignant tumors such as bronchogenic carcinoma, lymphoma and mediastinal metastases. Lung cancer accounts for 80% of cases, mediastinal lymphomas by 15% and 5% correspond to other causes. This case report aims to present an unusual case of this syndrome, which occurred in a male patient after penetrating wound in the chest, which developed a pseudoaneurysm of the aortic arch and superior vena cava syndrome.

ABREVIAÇÕES E ACRÔNIMOS

CEC: Circulação extracorpórea

FAB: Ferida por arma branca

SVCS: Síndrome da veia cava superior

VCS: Veia cava superior

INTRODUÇÃO

A síndrome da veia cava superior (SVCS) é caracterizada pelo conjunto de sinais e sintomas clínicos decorrentes da obstrução desse vaso. Tal síndrome apresenta-se de diversas maneiras, de acordo com a gravidade da obstrução, bem como a sua causa. A obstrução completa, causada em geral por doenças neoplásicas, evolui rapidamente para o óbito, enquanto que a decorrente de doenças benignas pode ser até mesmo assintomática [1].

A SVCS apresenta vários sinais e sintomas clínicos, como cefaleia, rubor facial, edema e desenvolvimento de circulação colateral no tórax. Outros sintomas comumente relatados são dispneia aos esforços, ortopneia, vertigens e alterações visuais [1-3].

A obstrução da veia cava superior (VCS) está relacionada, principalmente, a processos tumorais malignos, como carcinoma broncogênico, linfoma e metástase mediastinal. Como causas não malignas estão doenças tumorais, como teratoma e timoma, radiação, fibrose de mediastino, pneumotórax e aneurisma de aorta torácica, principalmente, em arco aórtico e porção ascendente. Diversas outras situações estão relacionadas à SVCS, uma vez que qualquer fator que cause uma compressão da VCS constitui possível etiologia, entre elas o implante de marcapasso transvenoso e o pseudoaneurisma de aorta [1-5].

Este relato de caso tem como objetivo descrever uma apresentação incomum de SVCS, ocorrido em um paciente do sexo masculino, após ferimento penetrante no tórax, resultando em pseudoaneurisma de arco aórtico e SVCS.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 25 anos, pardo, foi atendido na Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (Belém, PA, Brasil), com queixa principal de "dor torácica". Vítima de ferimento por arma branca (FAB) com mais de 48 horas de evolução, apresentando lesões perfuro-cortantes suturadas em região esternal e subclávia direita, com hematoma e dor local, além de referir dor durante a inspiração.

Ao exame físico o paciente apresentava-se em regular estado geral, consciente e orientado no tempo e espaço, normocorado, hidratado, eupneico, anictérico, acianótico, taquicárdico, pressão arterial dentro do limite da normalidade, estase jugular com equimoses em região subclávia direita e com edemas nos membros superiores, tórax e face.

O paciente foi submetido à monitorização cardíaca, fornecimento de oxigênio por cateter nasal e realizada radiografia de tórax. Após análise radiológica, que demonstrou alargamento do mediastino, foi solicitado ecocardiograma com Doppler para melhor elucidação diagnóstica.

O laudo do ecocardiograma relatava dificuldades técnicas devido ao edema local, ainda assim revelando restrição diastólica leve, com fração de ejeção de 73%, diâmetro de vasos e cavidades cardíacas normais, bem como arco aórtico e aorta descendente sem alterações.

Em decorrência desse resultado e da não disponibilidade no momento de um tomógrafo funcionante na instituição, foram solicitadas arteriografia e venografia.

Na arteriografia (Figura 1A) e na venografia (Figura 1B), foi visualizado pseudoaneurisma em região anterior e lateral do arco aórtico próximo à origem do tronco braquiocefálico, com compressão de VCS, confirmando o diagnóstico de SVCS pós-trauma.

 

 

Com a confirmação do diagnóstico e devido à grande probabilidade de ruptura do pseudoaneurisma na abertura, o paciente foi encaminhado para tratamento cirúrgico, onde foi realizada toracotomia parcial do esterno para instalação de circulação extracorpórea (CEC), optando-se pela canulação da aurícula direita e da artéria femoral direita. Depois instalação da CEC, completou-se a toracotomia que ocasionou a ruptura do pseudoaneurisma, sendo o sangramento rapidamente controlado (Figura 2).

 

 

Com a identificação do orifício de aproximadamente 2 cm, localizado em arco aórtico, próximo ao tronco braquiocefálico, foi realizada rafia simples com reforço de pericárdio bovino, não havendo necessidade de parada circulatória total. Posteriormente, foram realizados os procedimentos habituais para saída de CEC e fechamento do paciente. Com a confirmação do diagnóstico etiológico, não houve necessidade de realização de exame histopatológico.

Após o procedimento cirúrgico, o paciente evoluiu de maneira satisfatória, recebendo alta hospitalar no nono dia de pós-operatório.

 

DISCUSSÃO

A maioria dos pacientes acometidos por SVCS apresenta idade entre 50 e 70 anos. Faixa etária esta relacionada à principal causa da síndrome, que são os processos tumorais malignos. Crianças também podem ser acometidas, sendo causadas, principalmente, pelos linfomas não-Hodgkins ou causas benignas [3].

Como já relatado, os sintomas da SVCS podem incluir sensação de peso na cabeça, dispneia e tosse. Achados clínicos podem incluir edema facial e no pescoço; presença de circulação colateral sobre o tronco, extremidades superiores e pescoço, rubor facial, cianose; estridor respiratório, angústia e sinais neurológicos podem estar presentes [1,3]. Ao exame físico, o paciente relatado apresentava estase jugular e edema dos membros superiores, tórax e face, sinais que corroboraram com a suspeita dessa síndrome. Porém, como observado, o paciente apresentava história de FAB há mais de 48 horas, tempo este não suficiente para que o mesmo apresentasse circulação colateral, uma vez que vasos colaterais demoram várias semanas para acomodar o fluxo sanguíneo desviado da VCS. Dessa forma, a presença de circulação colateral não é comum em casos de SVCS com rápida evolução [6].

Após realização dos exames complementares, que demonstraram alargamento do mediastino pela radiografia de tórax, e a não conclusão do diagnóstico pelo ecocardiograma, haveria a necessidade da realização de uma angiotomografia de tórax, cuja vantagem incluiria menor tempo para a aquisição das imagens, quando comparada à angioressonância. A angiotomografia é essencial para a avaliação da SVCS, por identificar claramente a causa da síndrome, a extensão da doença, o local e o grau de obstrução venosa [2]. Considerando-se que esses recursos eram indisponíveis na instituição, optou-se pela realização da venografia e arteriografia, que evidenciaram a lesão (pseudoaneurisma) localizada na aorta, próximo ao tronco braquiocefálico, e consequente compressão da VCS.

Na SVCS, o reconhecimento do risco de vida e sintomas sugestivos de comprometimento das vias aéreas ou edema cerebral é essencial para reduzir os riscos de complicações. Havendo evidências de comprometimento das vias aéreas, como estridor, associadas a achados como edema de laringe ou obstrução traqueal na tomografia de tórax, devem ser tratados como situação de emergência clínica, necessitando de intervenções para proteção das vias aéreas, como, por exemplo, o tubo endotraqueal [1].

O tratamento da SVCS baseia-se na sua etiologia. O paciente apresentava pseudoaneurisma de aorta, necessitando de tratamento imediato, uma vez que a ruptura traumática da aorta torácica constitui uma emergência cirúrgica, muitas vezes fatal nas primeiras horas após a lesão [7].

Entre as opções de tratamento endovascular, alguns autores obtiveram sucesso utilizando endopróteses com exclusão do pseudoaneurisma. Em alguns casos, o tratamento endovascular pode ser combinado com o cirúrgico, utilizando um balão percutâneo para ocluir o orifício do pseudoaneurisma, procedimento este que precede a correção cirúrgica eletiva [8].

A utilização de um stent endovascular constitui forma de tratamento menos invasiva para doenças da aorta e pode ser considerada alternativa ao tratamento cirúrgico convencional. As vantagens do tratamento endovascular comparado à correção cirúrgica de doenças da aorta incluem: evitar a toracotomia e a circulação extracorpórea, bem como minimizar as complicações de um procedimento aberto [7].

No tratamento da SVCS, a angioplastia com colocação do stent é atualmente o método que fornece o alívio mais rápido da obstrução da VCS. Após a colocação do stent, a cefaleia é aliviada imediatamente, o edema facial em 24 horas, enquanto o edema em membros superiores e em tronco é resolvido em 72 horas, em média. Para evitar complicações trombogênicas, a maioria dos pacientes recebe profilaxia com anticoagulantes e antiagregantes plaquetários [3,8].

REFERÊNCIAS

1. Wan JF, Bezjak A. Superior vena cava syndrome. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24(3):501-13. [MedLine]

2. Joji M, Ryoko M, Shin-Ichiro M, Yoshio H, Yuhei S, Noriyuki S, et al. Superior vena cava obstruction caused by ascending aortic pseudoaneurysm as assessed by multi-detector row computed tomography. J Cardiol Cases. 2011;3(2):e98-e102.

3. Nunnelee JD. Superior vena cava syndrome. J Vasc Nurs. 2007;25(1):2-5. [MedLine]

4. Costa R, Leão MIP, Silva KR, Camargo PR, Costa RV. Marcapasso bi-atrial epicárdico subxifóide na obstrução da veia cava superior. Arq Bras Cardiol. 2006;87(4):e101-3. [MedLine]

5. Vydt T, Coddens J, Wellens F. Superior vena cava syndrome caused by a pseudoaneurysm of the ascending aorta. Heart. 2005;91(4):e29. [MedLine]

6. Kim HJ, Kim HS, Chung SH. CT diagnosis of superior vena cava syndrome: importance of collateral vessels. AJR Am J Roentgenol. 1993;161(3):539-42. [MedLine]

7. Buz S, Zipfel B, Mulahasanovic S, Pasic M, Weng Y, Hetzer R. Conventional surgical repair and endovascular treatment of acute traumatic aortic rupture. Eur J Cardiothorac Surg. 2008;33(2):143-9. [MedLine]

8. Ibáñez Maraña MA, Gutiérrez Alonso V, Cenizo Revuelta, N, San Norberto García EM, González Fajardo JA, Río Solá L, et al. Combined treatment, endovascular and surgical treatment of postraumatic pseudoaneurysm in the aortic arch. EJVES Extra. 2006;12(3):25-9.

Article receive on sexta-feira, 4 de maio de 2012

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