Article

lock Open Access lock Peer-Reviewed

40

Views

ARTIGO ORIGINAL

Comissurotomia mitral: como evoluem os pacientes a longo prazo?

Antoninho S ArnoniI; W. J CoutoI; Jarbas J DinkhuysenI; Paulo ChaccurI; Zilda M MenegheloI; Luiz Carlos Bento de SouzaI; Adib D JateneII; Paulo P PaulistaI

DOI: 10.1590/S0102-76381990000200006

RESUMO

Procuranco saber qual a evolução a longo prazo daqueles pacientes submetidos a comissurotomia mitral há mais de 14 anos, analisamos 100 pacientes, operados entre 1962 e 1975 e que tiveram seu acompanhamento no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. Muitos pacientes foram operados nesse intervalo, mas não tiveram seu seguimento em nossa Instituição e não foram considerados. Setenta e seis eram do sexo feminino e 24 do masculino, com idades variando de 11 a 50 anos, com média de 30,8 anos. Sessenta e cinco pacientes foram reoperados, sendo que em 18 ocasiões realizou-se outra comissurotomia, em um fez-se a revascularização, em um substituição da valva tricúspide; em 45 vezes a valva foi substituída (43 próteses biológicas e duas metálicas). O tempo médio entre a primeira e a segunda cirurgias foi de 13,6 anos. Não houve óbitos na reoperação. Trinta e cinco pacientes continuam em evolução da primeirs cirurgia, com um tempo médio de 17,2 anos, com um mínimo de 14 anos e um máximo de 27 anos. Dez estão no grupo funcional I, 17 no II, sete no III e um no grupo IV. Desta forma, dos 100 pacientes iniciais, 52 ainda estão com suas valvas naturais, mostrando que, apesar de a evolução da doença poder levar a alterações nas valvas operadas, a comissurotomia mitral consegue uma boa evolução a longo prazo.

ABSTRACT

To evaluate a longterm evolution of patients who were submitted to an open mitral commissurotomy, we studied 100 patients who were operated upon between 1962 and 1975. They have had follow-up in the Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia for the minimum of 14 years. Sixty-six were women and 24 were men. Their ages ranged from 11 to 50 years, and the media was 30.8 years. Sixty-five patients were reoperated and 18 of them were submitted to a new commissurotomy; in one a revascularization was done; in one the replacement of tricuspide valve; and in 45 times the valve was replaced (43 biological prosthesis and 2 metalics). The medium time among he first and the second surgery was 13.6 years. There wasn't any death among the reoperations. Thirty five patients keep in evolution of the first surgery, the medium time is 17.2 years (minimun 14 years and maximum 27 years). Ten are in the NYHA functional class I, 17 in II, seven in III and one in class IV. After this time of evolution, 52 patients are with their natural valves, showing good evolution of the mitral commissurotomy.
Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

DR. WANDERLEY NETTO
Maceió, AL

O trabalho do Dr. Arnoni procura nos trazer uma luz a respeito da evolução a longo prazo dos pacientes submetidos a valvotomia mitral aberta. Por dificuldades já expostas pelo autor, não foi possível o seguimento dos pacientes consecutivamente operados e por isso não temos informações com análise atuarial predictiva da efetividade de operação, sobrevida, etc. Apesar dessa limitação, o trabalho traz informações importantes: 1) o cirurgião pode fazer uma 2! comissurotomia, com bom resultado tardio. 2) os pacientes mais jovens e os operados em grau funcional avançado (mais tempo de sintomas) e alteração do ritmo são mais reoperados e têm resultado funcional e sobrevida piores. Essas informações indicam que, uma vez diagnosticada uma estenose mitral grave, devemos recomendar a cirurgia, independentemente da gravidade dos sintomas e que, nos pacientes jovens, devemos fazer profilaxia secundária rigorosa de cardite reumática, para que possamos melhorar os resultados tardios, nesse grupo. Acreditamos que a efetividade da valvotomia dependerá, basicamente (assegurando-se uma operação bem realizada), do estado da valva, das alterações secundárias provocadas pela duração da doença e da evolução da doença reumática, que é crônica, auto-imune e tem comportamento diferente em cada paciente, e até regiões. A título de ilustração, no nosso Serviço, operamos, até o mês de março último, 842 pacientes para tratamento de valvopatias. Entre julho de 1978 e dezembro de 1982, fizemos um levantamento dos pacientes que se submeteram a valvotomia mitral e observamos a sobrevida e a necessidade de uma nova operação, que foi, em nove anos, de 94% e 68%, respectivamente. Quando comparamos as reoperações por valvotomia e troca de valva, observamos que o índice de reoperação foi muito próximo, indicando que, na doença reumática, qualquer que seja a operação, existe sempre a possibilidade de uma nova operação. Finalizando, gostaríamos de cumprimentar o Dr. Arnoni pelo seu trabalho, pelo tema abordado, sempre oportuno em nosso país e formularíamos três questões: 1) quais os achados cirúrgicos predominantes nas reoperações? 2) como eram, na 1º operação, os doentes que estão em classe III e IV? 3) os pacientes jovens foram submetidos a profilaxia para a doença reumática, e até que idade? Encerrando, agradecemos à direção do Congresso por este honroso convite, bem como a atenção dos senhores. Muito obrigado.

DR. ISEU AFFONSO DA COSTA
Curitiba, PR

Cumprimento o Dr. Arnoni e seus colaboradores, por sua contribuição a um velho tema que, hoje, após 40 anos de história da moderna cirurgia da valva mitral, ganha interesse, entre outros motivos, pelo surgimento da valvoplastia percutânea. Este tema é, para nós, também, motivo de estudo contínuo. No confronto entre o tratamento cirúrgico e as valvoplastias percutâneas, tem importância, também, o risco do procedimento. Notamos que o Dr. Arnoni registra mortalidade de 1,1% para a comissurotomia aberta, no I.D.P.C., o que está de acordo com a literatura, que mostra, inclusive, menor mortalidade do que para a comissurotomia fechada. Revimos, recentemente, com o mesmo objetivo que o Dr. Arnoni, os resultados imediatos da comissurotomia aberta, durante a década de 1979 a 1988, no Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Os resultados imediatos são muito satisfatórios e, naturalmente, o próximo passo é realizar uma análise tardia, tal como fizeram o Dr. Arnoni e seus colaboradores. Estudando o presente trabalho, restaram algumas dúvidas, que o Dr. Arnoni, certamente, poderá esclarecer. Em primeiro lugar, o estudo refere-se a amostra de 100 casos, de um universo de 1841 (5,4%). Metodologicamente, seria necessário comprovar que a amostra não difere, em suas características, da população geral. Certamente, objeções podem ser levantadas de que a amostra apresente viezes importantes. Um dado que julgo importante é o de que o estudo, selecionando 100 pacientes que tiveram seguimento regular no I.D.P.C., exclui, ipso facto, pacientes que faleceram tardiamente. Na verdade, foi analisada a evolução de 100 sobreviventes tardios à comissurotomia mitral. Por outro lado, há referência ao estado funcional dos pacientes no pós-operatório, mas não no pré-operatório. Sabemos que o resultado tardio da comissurotomia é influenciado por este fator, e algumas conclusões poderiam ser tiradas a partir de sua análise. Dos 100 pacientes, 65 foram a reoperação (aos quais devemos acrescentar mais quatro, com três operações e dois, com quatro operações). Das 65 reoperações (63 foram na valva mitral), portanto, apenas 37 foram operações que ainda estavam satisfatórias no período estudado. Entretanto, dos 35 pacientes que não necessitaram nova intervenção, oito estão nas classes III e IV NYHA, de modo que temos 27 pacientes que podem ser considerados satisfatórios (27%). Outro fato que nos chamou a atenão foi a distribuição etária nos resultados. Assim, de oito pacientes operados com idades abaixo de 20 anos, seis foram reoperados. Caberá concluir que a valvoplastia percutânea é a opção inicial preferível neste grupo? Verificamos que, abaixo de 40 e, principalmente, abaixo de 30 anos de idade, a probabilidade de reoperação é de mais de 70%, o que seria utilizável, como argumento para opção inicial pela valvoplastia. Para esclarecer essas dúvidas, necessitamos de outros estudos, como o do Dr. Arnoni e colaboradores, bem como de semelhante análise dos resultados de valvoplastia percutânea, antes de ser possível uma decisão bem fundamentada sobre o problema.

DR. ARNONI
(Encerrando)

Gostaria de agradecer os comentários do Dr. Wanderley e do Dr. Iseu, e salientar a dificuldade que existe, em nosso país, de se conseguir a evolução a longo prazo dos pacientes. Por esse motivo, nos preocupamos em analisar os pacientes que fizeram sempre sua evolução em nossa Instituição, procurando saber a sobrevida do procedimento e não dos pacientes. Como todo trabalho retrospectivo, tivemos dificuldades em saber como eram as valvas no primeiro procedimento, o que nos impediu, inclusive, de comparar nossos resultados com os da literatura, no que diz respeito às calcificações e comprometimento subvalvar, que, seguramente, devem ter interferido na evolução tardia. Quanto à profilaxia, ela é realizada sempre com emprego de penicilina benzatina de três em três semanas. Com relação aos problemas levantados pelo Dr. Iseu, quero crer que a valvoplastia percutânea possa ser um bom procedimento em pacientes selecionados. Aqueles que têm comprometimento subvalvar, que correspondem a 60 ou 70% dos casos, não devem ter resultados bons a médio prazo, uma vez que o balão só abre as comissuras, mas não consegue atuar no subvalvar. Além disso, esse é um procedimento novo, que vai precisar de uma análise a longo prazo, para poder compará-lo com um procedimento tão bem estabelecido e com resultados bons a longo prazo, como a comissurutomia mitral.

REFERÊNCIAS

1. AKINS, C. W.; KIRKLIN, J. K.; BLOCK, P. C.; BUCKLEY, M. J.; AUSTEN, G. - Preoperative evaluation of subvalvar fibrosis in mitral stenosis. Circulation, 60: 71-76, 1979. [MedLine]

2. ANTUNES, M. J.; MAGALHÃES, M. P.; COLSEN, P. R.; KINSLEY, R. H. - Valvoplasty for rheymatic mitral valve disease: a surgical challenge. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 94: 44-56, 1987. [MedLine]

3. ARNONI, A. S.; SALERNO, P. R.; HENRIQUES NETO, A. T. M.; DINKHUYSEN, J. J.; CHACCUR, P.; ABDULMASSIH NETO, C.; NAVARRO, S. L.; ESTEVES, C. A.; RAMOS, A. I. O.; SOUSA, J. E. M. R.; JATENE, A. D.; SOUZA, L. C. B.; PAULISTA, P. P. - O papel do cirurgião nas valvopatias reumáticas tratadas com valvoplastia percutânea. Rev. Bras. Cardiovasc., 4: 51-63, 1989.

4. BAILEY, C. P. - The surgical treatment of mitral stenosis (mitral comissurotomy). Dis. Chest., 15: 377-389, 1949.

5. CAMARANO, G. P.; POMERANTZEFF, P. M. A.; JATENE, F.; BARBERO-MARCIAL, M.; MORAES, A. V.; GRINBERG, M.; BELLOTTI, G.; PILEGGI, F. J. C.; JATENE, A. D. - Avaliação do tratamento cirúrgico da valva mitral através de ecocardiografia intra-operatória. Arq. Bras. Cardiol., 50: 237-242, 1988. [MedLine]

6. CARPENTER, A.; CHAUVAUD, S.; FABIANI, J. N.; DELOCHE, A.; RELLAND, J.; LESSANA, A.; D'ALLAINES, C. L.; BLONDEAU, P.; PIWNICA, A.; DUBOST, C. - Reconstructive surgery of mitral valve incompetence: ten year appraisal. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 79: 338-348, 1980. [MedLine]

7. COSGROVE, D. M.; CHAVES, A. M.; LYTLE, B. W.; GILL, C. C.; STEWART, R. W.; TAYLOR, P. C.; GOORMASTIC, M.; BORSH, J. A.; LOOP, F. D. - Results of mitral valve reconstruction. Circulation, 74: 182-187, 1986.

8. CUTLER, E. C. & BECK, C. S. - The present status of the surgical procedure in chronic valvular disease of the heart. Arch. Surg., 18: 403-416, 1929.

9. DEKKER, A.; BLACK, H.; VON LICHTENBERG, F. - Mitral valve restenosis: a pathologic study. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 55: 436-446, 1968.

10. DURAN, C. G.; REVUELTA, J. M.; GAITE, L.; ALONSO, C.; FREITAS, M. G. - Stability of mitral reconstructive surgery at 10-12 years for predominantly rheumatic valvular disease. Circulation, 78: 191-196, 1988.

11. GALLOWAY, A. C.; COLVIN, S. B.; BAUMANN, G.; ESPOSITO, R.; VOHRA, R.; HARTY, S.; FREEDBERG, R.; KRONZON, I.; SPENCER, F. C. - Long-term results of mitral valve reconstruction with Carpentier techniques in 148 patients with mitral insufficiency. Circulation, 78 (Supl. 1): 97-105, 1988.

12. GERMANI, S.; MESSMER, B. J.; HALLMAN, G. C. - Open mitral commissurotomy. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 62: 366-368, 1971.

13. GROOS, R. I.; CUNNINGHAM Jr., J. N.; SNIVELY, S. L.; CATINELLA, F. P.; NATHAM, I. M.; ADAMS, P. X.; SPENCER, F. C. - Long-term results of open mitral commissurotomy: ten-year follow-up study of 202 patients. Am. J. Cardiol., 47: 821-825, 1981. [MedLine]

14. HALSETH, W. L.; ELLIOT, D. P.; WALKER, E. L.; SMITH, E. A. - Open mitral commissurotomy: a modern re-evaluation. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 96: 33-38, 1988. [MedLine]

15. HARKEN, D. E.; ELLIS, L. B.; WARE, P. F.; NORMAN, L. R. - The surgical treatment of mitral stenosis: I. Valvuloplasty. N. Engl. J. Med., 239: 804-808, 1948.

16. HERMANN, H. C.; WILKINS, G. T.; ABASCAL, V. M.; WEYMAN, A. E.; BLOCK, P.C.; PALACIOS, I. F. - Percutaneous balloon mitral valvotomy for patients with mitral stenosis. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 96: 33-38, 1988. [MedLine]

17. HIGGS, L. M.; GLANCY, D. L; O'BRIEN, K. P.; EPSTEIN, S. E.; MORROW, A. G. - Mitral restenosis: an uncommon cause of recurrent symptoms following mitral commissurotomy. Am J. Cardiol., 26: 34-37, 1970. [MedLine]

18. HOUSMAN, L. B.; BONCHEK, L.; LAMBERT, L.; GRUNKEMEIER, G.; STARR, A. - Prognosis of patients after open mitral commissurutomy: actuarial analysis of late results in 100 patients. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 73: 742-745, 1977. [MedLine]

19. INOUE, K.; OWAGI, T.; NAKAMURA, T.; KITAMURA, F.; MYIAMOTO, N. - Clinical application of transvenous mitral commissurotomy by a new balloon catheter. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 87: 394-402, 1984. [MedLine]

20. KENNEDY, J. W.; DOCES, J. G.; STEWART, D. K. - Left ventricular function before and following surgical treatment of mitral valve disease. Am. Heart J., 97: 592-598, 1979. [MedLine]

21. KYO, S.; TAKAMOTO, S.; MATSUMURA, M.; ASANO, H.; YOKOTE, Y.; MOTOYAMA, T.; OMOTO, R. - Immediate and early post-operative evaluation of results of cardiac surgery by transesophageal two dimensional doppler echocardiography. Circulation, 76 (Supl. 5): 113-121, 1987.

22. McGOON, D. C. - Repair of mitral insufficiency due to ruptured chordae tendinae. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 39: 357-362, 1960.

23. MANTEUFFEL-SZOEGE, L.; NOWICKY, J.; WASNIEWSKA, M.; SITKOWSKI, W.; TURSKI, C. - Mitral commissurotomy: results in 1700 cases. J. Cardiovasc. Surg., 11: 350-354, 1970.

24. MULLIN, M. J.; ENGELMAN, R. M.; ISOM, O. W.; BOYD, A. D.; GLASMANN, E.; SPENCER, F. C. - Experience with open mitral commissurotomy in 100 consecutive patients. Surgery, 76: 974-982, 1974. [MedLine]

25. PALACIOS, I.; BLOCK, P. C.; BRANDI, S.; BLANCO, P.; CASAL, H.; PULIDO, J. I.; MUNOZ, S.; D'EMPAIRE, G.; ORTEGA, M. A.; JACOBS, M.; VLAHAKES, G. - Percutaneous balloon valvotomy for patiens with severe mitral stenosis. Circulation, 75: 778-784, 1987. [MedLine]

26. SMITH, W. M.; NEUTZE, J. M.; BARRATT-BOYES, B. G.; LOWE, J. B. - Open mitral valvotomy: effect of preoperative factors on results. J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 82: 738-751, 1981. [MedLine]

27. STARR, A. & EDWARDS, M. L. - Mitral replacement: clinical experience with a ball valve prosthesis. Ann. Surg., 154: 726, 1961. [MedLine]

28. VEGA, J. L.; FREITAS, M.; MARTINEZ, R.; GALLO, J. I.; GUTIERREZ, J. A.; COLMAN, T.; DURAN, M. G. - Open mitral commissurutomy. Ann. Thorac Surg., 31: 266-270, 1981. [MedLine]

CCBY All scientific articles published at www.bjcvs.org are licensed under a Creative Commons license

Indexes

All rights reserved 2017 / © 2024 Brazilian Society of Cardiovascular Surgery DEVELOPMENT BY