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COMUNICAÇÃO PRÉVIA

Variáveis capnográficas pré e pós-tromboendarterectomias pulmonares

Marcos Mello MOREIRAI; Renato Giusepe Giovani TERZIII; Reinaldo Wilson VieiraIII; Orlando PETRUCCI JUNIORIV; Ilma Aparecida PaschoalV; Pedro Paulo Martins de OliveiraVI; Karlos Alexandre de Souza VilarinhoVII; Domingo M BraileVIII

DOI: 10.1590/S0102-76382007000400022

INTRODUÇÃO

Sabe-se que podem ocorrer mortes inesperadas por tromboembolismo pulmonar (TEP) e que a anticoagulação é freqüentemente efetiva em reduzir a possibilidade de um novo fenômeno embólico e a morte. Por este motivo, em pacientes com suspeita de TEP, seriam desejáveis métodos não-invasivos e disponíveis a serem incorporados como parte da avaliação à beira do leito. Técnicas à beira do leito para avaliar pacientes com TEP baseiam-se em alguns parâmetros respiratórios derivados do espaço morto alveolar. Porém, estas variáveis têm algumas limitações pelas dificuldades de diferenciar pacientes com TEP daqueles com outras doenças pulmonares obstrutivas crônicas (DPOC). Para superar esta dificuldade, Eriksson et al. [1] descreveram um método gráfico para extrapolar o gradiente artério-alveolar (P(a-et)CO2) a uma virtual expiração tardia, denominando esta variável de fração tardia de espaço morto (fDlate). Os autores realizaram um estudo em 38 pacientes com suspeita de TEP e observaram que a fDlate era superior a 0,12 em indivíduos normais e, em pacientes com DPOC, a fDlate era inferior a 0,12. Outra variável capnográfica, a fração do espaço morto alveolar end-tidal (AVDSf) [2], calculada pela expressão matemática PaCO2 - PetCO2 / PaCO2, "corrigiu" o resultado falso-negativo da fDlate. Neste relato de dois casos, foi possível correlacionar os resultados de imagem com a fDlate, a AVDSf e o gradiente artério-alveolar de CO2 [P(a-et)CO2], antes e após a tromboendarterectomia cirúrgica da artéria pulmonar.


MÉTODO

Paciente 1


Paciente de 69 anos, do sexo masculino, deu entrada na UTI após internação na enfermaria com história de dispnéia, palpitações e tosse seca; negava pneumopatia e tabagismo. Ao exame físico, o pulso era arrítmico, apresentava hepatomegalia discreta. A gasometria arterial revelava hipoxemia (PaO2 = 48,8 mmHg) e hipocapnia (PaCO2 = 31mmHg). O ecocardiograma mostrou aumento moderado do ventrículo direito, hipertensão de artéria pulmonar com a pressão sistólica estimada em 76 mmHg e trombo no átrio direito com dimensões aproximadas de 30 X 20 mm. Com a hipótese diagnóstica inicial de TEP, foi iniciada a anticoagulação plena com heparina não-fracionada. O paciente foi mantido em oxigenioterapia com máscara de Venturi. A cintilografia pulmonar de ventilação/perfusão mostrou múltiplas áreas de hipoperfusão compatíveis com embolização pulmonar difusa.

A tomografia computadorizada helicoidal (TCH) demonstrou a presença de trombos nas artérias pulmonares direita e esquerda, estendendo-se até seus ramos segmentares posteriores. Considerando a história de mais de duas semanas de evolução e por estar mantendo estabilidade clínica e hemodinâmica, suspeitou-se de embolia crônica, extensa, sendo contra-indicada a trombólise química. Após a avaliação hemodinâmica, foi realizada tromboendarterectomia pulmonar [3].

Paciente 2

Paciente de 42 anos, sexo masculino, portador da síndrome anticorpo antifosfolípide, tabagista há 15 anos (um maço/dia), apresentava ao exame físico dispnéia aos pequenos esforços e normotenso. A gasometria arterial revelou hipoxemia com PaO2 = 64,9mmHg, PaCO2 = 31,4mmHg e sO2 = 92,9%. O ecocardiograma mostrou hipertensão de artéria pulmonar com a pressão sistólica estimada em 75 mmHg, trombo volumoso (17 x 67 mm) aderido à parede anterior do ventrículo direito (VD), obstruindo sua via de saída. A cintilografia pulmonar demonstrou falha de perfusão nos segmentos basais do pulmão esquerdo e direito. A TCH mostrou falha de enchimento em VD, compatível com trombo em artéria interlobar descendente esquerda, com áreas de infarto pulmonar em lobo inferior esquerdo. Este paciente foi considerado para tratamento cirúrgico em virtude da obstrução de VD, além de apresentar trombo na artéria pulmonar direita, evidenciado pela arteriografia. A artéria pulmonar esquerda estava livre de êmbolos.

A capnografia volumétrica foi registrada com o Monitor de Perfil Respiratório CO2SMO Plus 8100á Dixtal/Novametrix. Os dados capnográficos foram gravados por um período de três a cinco minutos, com os pacientes em ar ambiente e, em seguida, foi colhida uma gasometria arterial [4]. A fDlate foi calculada após a determinação PetCO2 tardia, ou seja, extrapolada a 15% da Capacidade Pulmonar Total (CPT), de acordo com Eriksson et al. [1].

fDlate = PaCO2 - Pet(15% CPT)CO2/PaCO2

PaCO2 é a pressão parcial de CO2 no sangue arterial;

Pet (15%CPT) CO2 é a pressão parcial de CO2 no ar expirado extrapolada para 15% da CPT. CPT (Capacidade Pulmonar Total), obtida de tabela previamente publicada e baseada na idade, peso e altura do paciente [3].

Para cálculo da AVDSf [2] foi utilizada a seguinte expressão:

AVDSf = PaCO2 - PetCO2/PaCO2

Técnica operatória

No paciente 1, foi realizada arteriotomia pulmonar com tromboendarterectomia dos seus ramos direito e esquerdo, com o auxílio de circulação extracorpórea em hipotermia profunda e parada circulatória total. Após arteriorrafia e aquecimento do paciente, a circulação extracorpórea foi interrompida. O paciente teve alta no sexto dia de pós-operatório. No paciente 2, foi retirado trombo volumoso com aproximadamente 70 mm de diâmetro, que ocluía a via de saída do VD e tromboendarterectomia na artéria pulmonar direita, com auxílio de circulação extracorpórea, sem uso de hipotermia profunda e o paciente recebeu alta no 13º dia pós-operatório. Antes da alta, ambos foram submetidos à nova cintilografia pulmonar de perfusão, que evidenciou melhora significativa no paciente 1. No paciente 2, observou-se discreta melhora da perfusão nos terços médio e superior de ambos os pulmões, piora nos segmentos dos lobos inferiores e melhora da dispnéia aos pequenos esforços. Os valores pré e pós-cirúrgicos da fDlate, AVDSf, P(a-et)CO2 e slope 3 podem ser vistos na Tabela 1.




DISCUSSÃO

Verschuren et al. [5] observaram que, após trombólise química para TEP, o valor do Slope 3 aumentou, o que refletiu melhora da perfusão e conseqüente diminuição do espaço morto alveolar e da P(a-et)CO2. Em outro estudo, Thys et al. [6] observaram melhora da AVDSf e P(a-et)CO2 após mesmo tratamento. Com o procedimento cirúrgico observamos o mesmo, tanto para o paciente 1, com confirmação pela cintilografia de controle, quanto para o paciente 2. O paciente 2 apresentou coerência nas variáveis capnográficas, quando comparadas à cintilografia de controle, embora referisse melhora clínica.

Em resumo, o paciente 1 apresentou diagnóstico de TEP pelos valores do fDlate e AVDSf, que se confirmaram pelas imagens no pré e a melhora das mesmas no pós-operatório, bem como as variáveis capnográficas. O paciente 2 apresentou diagnóstico por TEP pelas duas variáveis capnográficas estudadas e métodos de imagem no pré operatório, contudo, no pós-operatório, a fDlate demonstrou melhora e o AVDSf não, o que foi confirmado pelos métodos de imagem, havendo então uma falsa melhora do fDlate. Assim, as duas variáveis capnográficas devem ser utilizadas em conjunto para uma melhora da especificidade e sensibilidade do método.

Paschoal et al. [7], comparando dados capnográficos de uma amostra de 108 pacientes com suspeita de TEP e 114 voluntários saudáveis, identificaram o valor do Slope 3 dos voluntários foi de 7,80±2,36. O primeiro paciente apresentou um valor médio de Slope 3 (Tabela 1) pouco maior que o do grupo controle, o que pode explicar o fato da variável AVDSf resultar maior quando comparada com a fDlate, ao passo que o segundo paciente apresentou o dobro do valor do Slope 3, o que explica o fato de uma fDlate falso-negativa. A fDlate está diretamente relacionada ao Slope 3, o que não acontece com a variável AVDSf e a P(a-et)CO2. Tal situação sugere que, quando um paciente apresentar Slope 3 maior que o valor do grupo controle, deva ser considerada a AVDSf e a P(a-et)CO2, a fim de, evitar provável resultado falso-negativo para a fDlate. De qualquer forma, ao se aplicar as duas variáveis, obteve-se 100% de sensibilidade para TEP.

Em recente estudo utilizando dados clínicos, D-Dímero e a AVDSf, Rodger et al. [8] afirmam que, ao aplicar duas variáveis deste protocolo em pacientes que chegam à Sala de Emergência com suspeita de TEP, pode-se reduzir em 36% a solicitação de exames de imagem.

Por outro lado, em países em desenvolvimento, os exames por imagem nem sempre estão disponíveis. Por esse motivo, métodos não-invasivos que possam excluir a possibilidade de TEP reduziriam, de forma considerável, o número de pacientes submetidos, desnecessariamente, aos exames por imagem, mesmo em hospitais onde estes exames estão disponíveis. Os exames não invasivos poderiam também ser usados em pequenos hospitais onde estes exames por imagem não estão disponíveis, objetivando selecionar pacientes a serem transferidos para instituições de referência para investigação por imagem.

Nos casos relatos, foram apresentados dois pacientes com diagnóstico de TEP confirmado pela imagem e pela capnografia volumétrica quando esta foi utilizada criteriosamente, levando em consideração as informações até aqui conhecidas.

Limitações do estudo

A amostra de apenas dois pacientes, sem dúvida, é uma limitação, mas o que está sendo colocado no trabalho é uma proposta de diagnóstico que deva ser melhor estudada no futuro.

Article receive on quinta-feira, 26 de julho de 2007

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