Article

lock Open Access lock Peer-Reviewed

5

Views

RELATO DE CASO

Nódulo de pulmão, estenose traqueal e doença coronariana: como abordar quando associadas?

Luiz Carlos de LIMAI; Silas Fernandes AVELARII; Fernando Luiz WESTPHALIII; Ingrid Loureiro de Queiroz LIMAIV

DOI: 10.1590/S0102-76382007000300016

RESUMO

Paciente de 67 anos, sexo masculino, submetido à toracotomia exploradora para ressecção de nódulo pulmonar. Apresentou parada cardíaca durante o ato anestésico devido a infarto agudo do miocárdio. Após manobra de ressuscitação, foi encaminhado para a UTI, permanecendo intubado por 7 dias, evoluindo posteriormente com estenose traqueal cervical. Foram realizadas, posteriormente, revascularização do miocárdio e ressecção do nódulo pulmonar num primeiro tempo e, depois, correção cirúrgica da estenose traqueal por traqueoplastia.

ABSTRACT

A 67-year-old male patient underwent exploratory thoracotomy for pulmonary nodule resection. The patient presented a cardiorespiratory arrest during anesthesia due to myocardium infarction. After reanimation the patient was sent to ICU where he remained intubated for 7 days. Subsequently, he developed cervical tracheal stenosis. At first, the patient underwent a myocardium revascularization followed by surgical resection of tracheal stenosis through tracheoplasty.
INTRODUÇÃO

O propósito da intervenção cirúrgica no nódulo de pulmão solitário é evitar lesões potencialmente malignas perdidas [1], especialmente nos estágios I e II, nos quais são curáveis [2].

Dos aproximadamente 25 milhões de pacientes nos Estados Unidos da América que se submetem a cirurgias não-cardíacas, cerca de 8 milhões destes possuem fatores de risco cardíaco maiores ou estão acima dos 65 anos. Com base nestas evidências, não é de se surpreender que as complicações cardíacas ocorram quando estes pacientes são submetidos ao estresse durante 3 a 4 dias do período perioperatório, com estimativas de morbidade cardíaca entre 1% e 10%, dependendo do paciente e do tipo de procedimento cirúrgico adotado [3].

O objetivo deste é relatar os riscos e complicações cardiorrespiratórias ocorridas em um paciente submetido a cirurgia não cardíaca devido a um nódulo pulmonar.


RELATO DO CASO

Homem, 67 anos, em 29/6/2004 foi encaminhado ao Hospital de Oncologia para ressecção de nódulo pulmonar. Durante a indução anestésica, apresentou parada cardiorrespiratória, conseqüente a infarto agudo do miocárdio, além de acidente vascular cerebral occipital. Após manobra de ressuscitação, permaneceu com intubação orotraqueal no UTI por 7 dias, recebendo alta após 30 dias de internação. Trinta e cinco dias após a alta hospitalar, iniciou quadro de dispnéia e cornagem traqueal.

Foi realizada tomografia computadorizada do tórax e região cervical, que mostrou estenose traqueal no segmento cervical da traquéia (Figura 1).


Fig. 1 - Tomografia computadorizada de tórax mostrando estenose traqueal importante (seta)



Em 1/9/2004, foi submetido à broncoscopia e dilatação traqueal de urgênciab com implante de tubo T de Montgomery. Permaneceu hospitalizado por 5 dias, recebendo alta hospitalar com acompanhamento médico.

A punção transtorácica de 9/5/2005 não estabeleceu o diagnóstico. Realizou eletrocardiograma de estresse com dobutamina em 8/7/2005, com resultado positivo para isquemia e, em 9/8/2005, realizou cateterismo cardíaco, cujo resultado foi compatível com obstrução de 70% da artéria coronária descendente anterior esquerda, 80% da artéria circunflexa e 80% da coronária direita.

O paciente foi submetido a revascularização do miocárdio em 19/8/2005, sendo realizada ponte de mamária para artéria descendente anterior esquerda e ponte de safena para a artéria ventricular posterior esquerda. No mesmo ato operatório, foi realizada a ressecção do nódulo no pulmão direito (Figura 2) e biópsia de congelação que foi compatível com tumor benigno (Hamartoma).


Fig. 2 - Imagem tomográfica do tumor benigno do lobo inferior do pulmão direito



Apresentou deiscência de sutura do esterno sem mediastinite no pós-operatório, recebendo alta hospitalar sem outras complicações.

Após avaliação ambulatorial e recuperação pós-operatória, optou-se pela realização da traqueoplastia cérvico-torácica, em 12/12/05, com incisão em colar cervical e abertura parcial do esterno com manutenção do tubo T de Montgomery.

Recebeu alta hospitalar em bom estado geral e local, sendo realizado acompanhamento médico regular e exames periódicos para controle. O tubo T de Montgomery foi retirado em 7/3/2007, sendo necessária ressecção de granuloma por broncoscopia na linha de sutura, após 30 dias de retirada do tubo.

O paciente evoluiu satisfatoriamente e a broncoscopia de controle mostrou a luz traqueal pérvia e sem presença de granulomas.


DISCUSSÃO

Nódulos solitários de pulmão são encontrados em uma taxa de 1 a 2 em cada 1000 radiografias de tórax. Cerca de 30% destes nódulos mostram-se malignos. Dos outros nódulos, os benignos constituem cerca de 2 a 5% dos tumores primários de pulmão, um heterogêneo grupo, os quais incluem adenomas brônquicos, hamartomas, dentre outros [1].

A tragédia no câncer de pulmão está associada à demora na apresentação dos sintomas e no diagnóstico. Sinais e sintomas estão raramente presentes até a malignização tornar-se avançada e, possivelmente, sem possibilidades de ressecção. Pacientes com o melhor prognóstico são aqueles no estágio 1A (T1N0M0) da doença. Estes pacientes têm de 61 a 75% de sobrevivência em 5 anos após ressecção cirúrgica [4].

Para o ato cirúrgico, de um modo geral, a indução anestésica é feita via intravenosa e, uma vez que o estado de inconsciência é atingido, a anestesia é mantida por anestésicos inalatórios e intravenosos, com ou sem relaxantes musculares. Embora cada droga escolhida tenha suas propriedades específicas, pode-se dizer que, em termos gerais, os agentes anestésicos inalatórios reduzem a pressão arterial sanguínea por diminuir a resistência vascular sistêmica, contratilidade miocárdica e volume de ejeção, mostrando que a isquemia miocárdica, especialmente em pacientes com doença arterial coronariana, pode ser desenvolvida [3].

O paciente em questão era portador de nódulo pulmonar indeterminado, sendo submetido à toracotomia para ressecção do nódulo. Apesar da avaliação cardiológica prévia permitir a realização do procedimento, o paciente apresentou infarto agudo do miocárdio e parada cardiorrespiratória durante o ato anestésico.

Sabe-se que, dos pacientes que são submetidos à intubação traqueal, de 1000 pacientes, um evolui para estenose traqueal [7]. Este paciente, devido à complicação ocorrida no ato anestésico, permaneceu intubado por sete dias, sendo este o mecanismo que levou-o à estenose traqueal.

Um paciente pode apresentar, simultaneamente, doença cardíaca e pulmonar. Embora incomum, a terapêutica para estas lesões concomitantes ainda representa dilema para os cirurgiões. A maioria dos pacientes que possuem ambas as lesões apresenta primeiramente doença coronariana e um tumor pulmonar assintomático é encontrado na radiografia de tórax pré-operatória de rotina ou, menos freqüentemente, pacientes com câncer de pulmão apresentam-se com uma doença cardíaca substancial que, se não tratada, pode aumentar a morbi-mortalidade perioperatória da ressecção do tumor [5].

Cirurgiões podem relutar em realizar os dois procedimentos em uma única cirurgia [5]. Contudo, desta forma, evita-se dois procedimentos agressivos no mesmo paciente. Além disso, realizando-se em um primeiro momento a cirurgia cardíaca e, tempo depois, a ressecção pulmonar, como era feito classicamente, aumentam as taxas de morbidade e mortalidade da ressecção pulmonar pela demora na realização do procedimento [6].

Nosso paciente apresentava, além das duas doenças concomitantes, ainda estenose traqueal. Estas três situações em conjunto não foram encontradas na literatura consultada, motivo pelo qual optamos, em um primeiro tempo, pela revascularização do miocárdio com circulação extracorpórea e, após reversão da heparina, foi realizada a ressecção do nódulo pulmonar. Três meses após a recuperação do paciente, foi realizada a correção da estenose traqueal por traqueoplastia convencional. Devido à extensão da lesão, optamos pela permanecia do tubo de Montgomery, tendo sido retirado posteriormente.


REFERÊNCIAS

1. Perez N, Adediji O. Benign lung tumors. eMedicine Specialties/ Thoracic Surgery January 31, 2005.

2. Sharma S, Navaratnam S. Solitary pulmonary nodule. eMedicine Specialties/ Thoracic Surgery. February 16, 2004.

3. Potyk D, Raudaskoski P. Preoperative cardiac evaluation for elective noncardiac surgery. Arch Fam Med. 1998;7(2):164-73. [MedLine]

4. Saueressig MG, Macedo Neto AV, Moreschi AH, Xavier RG, Sanches PRS. A correção das estenoses traqueobrônquicas mediante o emprego de órteses. J Pneumol. 2002;28(2):84-93.

5. Tan BB, Flaherty KR, Kazerooni EA, Iannettoni MD; American College of Chest Physicians. The solitary pulmonary nodule. Chest. 2003;123(1 Suppl):89S-96S. [MedLine]

6. Rao V, Todd TR, Weisel RD, Komeda M, Cohen G, Ikonomidis JS, et al. Results of combined pulmonary resection and cardiac operation. Ann Thorac Surg. 1996;62(2):342-7.

7. Danton MH, Anikin VA, McManus KG, McGuigan JA, Campalani G. Simultaneous cardiac surgery with pulmonary resection: presentation of series and review of literature. Eur J Cardiothorac Surg. 1998;13(6):667-72. [MedLine]

CCBY All scientific articles published at www.bjcvs.org are licensed under a Creative Commons license

Indexes

All rights reserved 2017 / © 2024 Brazilian Society of Cardiovascular Surgery DEVELOPMENT BY